As Crônicas de Arian 2 – Capítulo 2 – A cidade proibida para mulheres de cabelo curto

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Capítulo 2 – A cidade proibida para mulheres de cabelo curto

Um estrondo ensurdecedor ecoou pelas planícies do Sul, anunciando a vinda de uma tempestade. O céu, antes claro, estava ficando mais e mais nublado conforme a noite caía.

— Dessa vez foi só um trovão. Felizmente, portais não costumam abrir nessa estrada, quando ocorre, é geralmente em meio a floresta à sua direita, ou aquelas montanhas à esquerda — disse um homem alto, com uma barba por fazer e um cabelo preto até o ombro, bastante bagunçado, tentando acalmar as pessoas a sua volta. A desconfiança deles não era à toa, já que a região ao norte de Amira era famosa pela abertura constante de portais temporários.

O grupo de 10 pessoas seguia por uma velha estrada ao Norte da cidade de Amira, em direção a Sunkeep. Eles encontraram Nixos em uma pequena cidade por que passaram a 1 dia, e ele acabou contratado para guiá-los por estradas alternativos, já que conhecia bem a região.

Aquela estrada em que estavam era pouco utilizada, devido aos perigos, mas comparado a estrada principal do Sul, essa era muito mais rápida, reduzindo 1 a 2 dias de viagem para quem desejava ir até Distany ou Sunkeep. No momento, estavam saindo de uma das piores partes: uma estrada à beira do desfiladeiro de uma grande montanha rochosa. A estrada principal, por outro lado, contornava a beira da montanha, esticando muito o tempo de viagem. Estavam seguindo por uma estrada de terra, com lindos campos verdes a sua volta. No horizonte, haviam várias montanhas rochosas em meio a uma vasta floresta.

Cinco pessoas, incluindo ele, estavam montadas a cavalo, duas a frente de uma carruagem preta, e três atrás. Ele estava com os de trás. Ao seu lado, uma cavaleira pouco expressiva, usando um corte de cabelo militar. Se chamava Zekasta, mas a maioria do tempo a chamavam de Zek. Do outro lado, um homem de cabelo castanho perdido em pensamentos, chamado Dorian. 

Na carruagem, sentada no banco do cocheiro, uma linda mulher loira, perto de seus 30 anos, Joanne, guiava os cavalos, com uma garota que parecia a filha dela sentada ao lado, e um jovem de cabelo preto com um livro na mão, chamado Jon, do outro. Dentro da carruagem não se podia ver nada, devido as cortinas fechadas, mas havia duas pessoas lá, um negro enorme e uma garota de cabelo castanho preso em um rabo de cavalo, que nunca se separava do seu arco e flecha. Até o momento, ele só conseguia definir aquela gente como estranha.

Estava escurecendo, e um vento calmo fazia as árvores a volta da estrada balançarem gentilmente. Não tão gentil era o vento forte e quente emanando do corpo de uma mulher montada a cavalo que estava à frente da carruagem. Ela não só estava com um leve brilho dourado no cabelo, como terra e folhas estavam voando sem parar a volta deles, graças a quantidade estúpida de energia que ela estava puxando da dimensão dos celestiais. Nexus não conseguia deixar de pensar que, para um grupo que desejava descrição, aquele ali parecia meio burro.

— Isso é ridículo! Vocês só estão querendo me torturar…  — reclamou Kadia, a mulher que estava ao lado de um homem com um manto verde-escuro. A garota aparentava ter algo entre 20 e 25 anos, tinha longos cabelos negros e uma roupa de couro colada ao corpo. A vestimenta chamava bastante atenção, mas seus olhos amarelos não ficavam atrás, ainda mais naquele momento, com eles brilhando devido ao uso que ela estava fazendo de energia da dimensão dos celestiais. Ela estava segurando um objeto quadrado cheio de inscrições, na mão esquerda. Sua respiração estava ofegante, e parecia sentir dor, ao mesmo tempo que tentava se concentrar. A luz em seus olhos apagava e voltava a todo momento.

— Você é muito fraca, Kadia, eu fiquei segurando esse treco por semanas  — riu a garotinha loira de uns 10 anos de idade, sentada no banco do cocheiro. A mulher ao lado dela era linda, mas a garota, mesmo naquela idade, conseguiu chamar ainda mais atenção. Não eram mãe e filha, mas qualquer um podia jurar que eram, principalmente devido ao cabelo loiro e olhos azuis das duas, que eram muito similares.

— Como isso vai me ensinar sobre magia celestial? — questionou Kadia, exausta.

— Você não disse que queria o método rápido de aprender a controlar energia celestial? A maldição da caixa ataca o seu corpo, e ele, em resposta, puxa energia celestial quase que inconscientemente para se defender. Depois de um tempo você aprende a fazer isso sem depender de uma maldição.

— Vocês torturam os alunos assim na Cidade de Luz para treiná-los?

— Bem… Não dão para os alunos itens amaldiçoados que podem matá-los, mas não temos opção aqui. E é ótimo para você aprender a controlar o fluxo. Lara é especializada nisso, e você é o extremo oposto, puxa uma quantidade absurda de energia por um círculo de conversão gigante, acaba com sua energia espiritual rapidamente, e entra no pagamento. O lado bom é que está liberando tanta energia extra a sua volta que os ferimentos da Zek e do Arian estão quase curados.

— Ela está é me fazendo desidratar com o calor que essa energia gera… — reclamou o cavaleiro com um manto verde, Arian, com seu cavalo alinhado ao lado do de Kadia. Estava com um livro aberto em uma das mãos, passando as páginas regularmente. A parte estranha é que não parecia estar lendo.

E aconteceu de novo, Arian parecia se distrair olhando a paisagem, e de repente, reagindo como se alguém o tivesse cutucado, passava o livro para a próxima página. 

— Ai! Como algo tão ridículo como papel pode cortar alguém tão fundo? — questionou ao passar uma nova página e notar que seu dedo tinha sido cortado.  Ele então olhou para a mulher a seu lado, Kadia, pensativo, e aproximou seu dedo cortado da cabeça dela, deixando sua mão um pouco atrás da nuca da garota.

— O que está fazendo? — questionou a mulher, intrigada.

— Dando utilidade a essa energia toda que está liberando. Acho que cura mais rápido se estiver perto, não?

Do nada, a mão de Arian pareceu ter sido jogada para frente, acertando a nuca de Kadia.

— Ai! O que você…?

— Desculpe, não fui… eu… — Arian estava encarando as costas do cavalo de Kadia, e fazendo uma cara emburrada. O guia o viu acertando a mão ali, então a desculpa não fazia sentido.

— Maldita fantasma ciumenta… Ai! Mas que droga, Arian! — A cabeça de Kadia tinha novamente sido jogada para frente. Algo tinha acertado sua nuca, pela segunda vez.

— Dessa vez não fui eu! 

Ao olharem para trás, viram a garota de 10 anos, Lara, rindo. Estava com um leve brilho dourado em uma das mãos. Pelo jeito tinha arremessado magia na nuca de Kadia, que agora estava com um olhar vingativo.

— Joanne, como faço aquilo de arremessar energia mesmo?

— Nem pense nisso. Com a quantidade de energia que está puxando vai destruir a carroça. E você, seu protótipo de gente, se quiser recuperar sua forma normal, para de gastar energia de graça — disse a líder do grupo, dando um tapa na nuca de seu clone em miniatura.

Lara olhou brava para Joanne, e depois mostrou a língua para ela.

— A idade mental dela regride com a aparência por acaso…?

— Acho mais provável que essa seja a real mentalidade dela…

Jon teve um ataque de risos com o comentário de Joanne, enquanto Lara ficava vermelha de raiva.

— De qualquer forma, isso ainda parece estúpido…

— Você pediu minha ajuda, Kadia, então fique quieta e faça o que eu digo! E ainda está puxando energia demais, você pode ver os círculos, então tente fazer vários pequenos em vez de um gigante, assim como viu a Lara fazer.

— Você fala como se fosse fácil… Ela nunca vai conseguir. — Lara esboçou um sorriso de provocação para Kadia.

Logo depois da garota dizer isso, o vento emanando de Kadia deu uma leve reduzida, para a infelicidade da garota.

— Continua provocando, Lara, tá funcionando melhor do que as minhas aulas — Joanne abriu um sorriso, provavelmente feliz por deixar Lara infeliz.

Foi quando um grito longo e agudo saiu de dentro da carruagem, fazendo a atenção de todos se voltarem para lá. O sorriso de Joanne sumiu e ela ficou com um olhar incrédulo, antes de questionar em voz baixa:

— Eles não estão?

Arian e Kadia começaram a rir sem parar, enquanto Lara tentava ver pelo vidro da carruagem, que estava com uma cortina o cobrindo.

— Filhos da mãe! Você disse que queria descansar, Marko! Que não estava totalmente recuperado! — gritou Joanne furiosa.

O guia teve que se controlar para não rir. Estava ouvindo uns gemidos leves faz algum tempo, mas ainda estava incrédulo que era aquilo mesmo, ao menos até agora.

Uma das janelas da carruagem se abriu, e um negro grande e musculoso, sem camisa, e todo suado, deu um sorriso cínico e falou:

— Já falei várias vezes, sexo me dá forças. E fui culpa da Irene, eu disse para ela gemer baixo…

A janela do outro lado da carruagem abriu, e uma mulher de cabelo e olhos castanhos, colocou a cabeça para fora, totalmente sem fôlego e com o cabelo todo bagunçado. Seu corpo era puro suor, transparecendo pela camisa branca com a maioria dos botões abertos.

— Estavam fazendo isso desde que saímos daquele bar depois do almoço?

— Estou tentando quebrar meu recorde — disse ele, com um sorriso confiante.

Joanne parecia incrédula, mas o guia não sabia se era devido ao feito de Marko fazendo sexo por quase um quinto do dia, ou só pela cara de pau dele.

— Eu não vou conseguir andar amanhã — disse Irene, parecendo exausta.

Zek, a mulher de armadura completa montada em um dos cavalos atrás da carruagem, parecia curiosa com a situação, olhando para Marko e depois para Joanne, com um ar de dúvida. Ela então avançou séria até perto da janela de Irene.

— Isso é bom mesmo? — perguntou Zek, aproximando seu corpo da janela.

Irene debruçou na janela e falou algo no ouvido de Zek, que fez seus olhos arregalarem e ficar levemente corada. Mesmo com tudo isso, sua expressão ainda conseguia se manter um tanto quanto apática, o que era estranho. Ela ficou pensativa, e depois olhou para o garoto ao lado de Lara, Jon, no banco do cocheiro.

— Que grupo fantástico nós somos… Se formos atacados, metade vai estar cansado demais para fazer alguma coisa.

— Como eu disse, sexo não…

— Cala a boca, Marko!

Joanne parecia possessa.

— Ei, Kadia, o que ela está pensando agora — perguntou Marko, nem um pouco preocupado com o nervosismo da líder do grupo.

— Está com mais inveja do que raiva, na verdade — respondeu Kadia, com um sorriso maligno, como se estivesse tentando se vingar do treinamento cruel a que estava sendo submetida.

Joanne ficou ainda mais furiosa depois disso, e começou a fazer um discurso muito chato para todo mundo ali.

Dorian, em um dos cavalos, na parte de trás da carroça, parecia perdido demais em seus próprios pensamentos para escutar alguma coisa.

Ao lado dele, o guia do grupo tinha cada vez menos confiança que aquelas pessoas conseguissem fazer algo, caso eles fossem atacados.

— Não se preocupe, Nixos, somos mais competentes do que parecemos. Acredita que chutamos a bunda de dois SS em Amira? — disse Irene, ao ver a cara de desconfiança do guia só aumentando. — E a propósito, qual a cidade mais próxima e com boa segurança? Não aguento mais acampar.

— Depois de comprar novos cavalos e carruagem, estamos quase sem fundos, não temos como pagar pousadas seguras, senão ficamos sem o bastante para comer.

— Pode usar minha parte se quiser, Joanne, quero apenas as respostas que Lara me prometeu — disse Arian. 

— Não acho correto… Mas… Na atual circunstância… Acho que vou aceitar a proposta.

— Você deve ter dinheiro sobrando para dispensar 40 moedas de ouro desse jeito… — Kadia parecia estar tentando ler a mente dele, mas não pareceu ter sucesso.

Arian não respondeu, mas Marko deu uma leve risada da janela da carroça, como se soubesse de algo que os outros não sabiam.

— Bem, a cidade de médio porte mais próxima é Amit, mas não acho uma boa ideia irmos para lá — falou o guia, pensativo.

Isso deixou Jon curioso, e ele logo questionou a resposta:

— Por quê? 

— Tem um outro nome que dão para Amit… 

— Acredita mesmo nessa bobagem? “A cidade proibida para mulheres de cabelo curto”. É uma das lendas mais estúpidas dessa região. — Arian parecia incomodado.

— Se quiserem ir para lá tudo bem, mas os relatos de mulheres de cabelo curto que entraram naquela cidade e desapareceram continuam surgindo há mais de 50 anos. Tem, com certeza, algo errado por lá — insistiu o guia.

— Bem, do grupo, só a Zekasta está em perigo. O que acha, Zek?

A mulher não respondeu Irene, só fez uma cara de que não estava nem aí para aquela história toda.

— Sei que não tem medo, Zek, mas é melhor não arriscarmos. Existe um fundo de verdade em toda superstição ou mito, e já temos problemas demais carregando essa porcaria. — Joanne apontou para a caixa na mão de Kadia.

— Agora que eu quero ir mesmo lá, só para provar que isso é tudo bobagem.

— Arian, acho que está levando sua falta de fé longe demais — disse Joanne.

— Só não acredito no que nunca vi acontecer…

— Então não acredita que eu vi a demônio que dá nome a cidade de Amira, e a celestial lendária, só porque você não viu?

— Pode ser uma mulher parecida… Ou podem ser mesmo elas, mas não acredito que sejam deuses que vieram te salvar, como está dizendo desde que saímos de Amira. Seja lá o que forem, te ajudar foi só uma coincidência.

— Você é inacreditável… Então eu não deveria acreditar que o cavaleiro da morte era um ex-integrante da sua guild, como você afirmou, já que eu não estava lá para ver.

— Lara, Marko, Irene e Joanne viram ele também — retrucou.

— Mas eu não, então para mim ainda é um fantasma que castiga pessoas ruins.

Arian e Jon continuaram discutindo pelo resto do caminho, enquanto Kadia, totalmente exausta, devolveu o objeto amaldiçoado a Lara. Mais à noite, começou a chover, e decidiram acampar em uma clareira perto da estrada, cercada por grandes árvores. Mas Irene não parecia conformada, ainda resmungando que deviam ir até Amit. Segundo o guia, a cidade estava bem próxima daquele local. Estavam desmontando dos cavalos, quando começou a chover e ouviram um forte estrondo:

— Estão ouvindo isso? — perguntou Marko, olhando na direção da floresta perto deles.

— Quem não ouviria? Acho que um portal acabou de abrir no meio dessa floresta, mas parece estar longe — respondeu Kadia, prendendo seu cavalo negro em uma árvore próxima.

— Não isso… Acho que tem animais correndo para cá.

— Fora a chuva e alguns pássaros, não estou ouvindo nada — disse Kadia, e o resto do grupo concordou.

— Minha audição é melhor que a de vocês… Está aumentando… Tem vários animais correndo nessa direção.

Do nada, uma árvore gigante no horizonte desapareceu, e depois outra.

— Mas que porcaria foi essa? — Dorian parecia nunca ter visto nada parecido.

— Montem, agora! São teleportadores!

Todos obedeceram o guia e voltaram para a estrada, forçando os cavalos ao máximo. Dessa vez só Joanne guiava a carruagem, enquanto Lara, Zek e Irene ficavam dentro. Marko tinha voltado a seu cavalo, que antes estava com Zek.

— Não podemos matá-los? — questionou Zek, olhando para trás pela janela.

— Se você encostar neles vai ser teleportado para outra área desse, ou de outro mundo, não tem como lutar contra eles, você só foge! Ao menos é isso que dizia no livro que li na guild do Arian — falou Jon, olhando a todo momento para trás, a procura da ameaça. Nada podia ser visto, no entanto, apenas árvores altas sumindo ao longe.

— Só isso que dizia lá? — Joanne parecia bastante preocupada com a situação.

— Eles vêm de portais, sempre nessa área do Sul, e a maioria morre depois de alguns dias. Eles parecem não conseguir respirar direito nesse mundo e odeiam uma árvore rara que tem nessa região.

— Que ótimo, então só temos que rezar para os cavalos aguentarem uns 2 dias correndo e sobrevivemos — debochou Dorian.

— Não vai dar certo, eles correm mais rápido que cavalos. — completou Jon, cada vez mais pálido.

— Vamos para Amit, não temos mais escolha! — gritou o guia.

— E o que vai impedir os teleportadores de entrarem lá? — perguntou Irene.

— A árvore que o garoto comentou… Ela exala um cheiro que eles não suportam, e todas as cidades dessa região plantaram algumas à sua volta para evitá-los. 

— Devíamos comprar umas mudas desse negócio — Dorian, apesar de tudo, continuava se mantendo calmo.

— As folhas liberam um cheiro horrível, corroem quase tudo que encosta nelas e exalam um gás venenoso. Para piorar, costumam usar elas em assassinatos planejados, então se te pegarem com uma folha sequer, você, muito provavelmente, vai acabar preso. Só um louco carregaria algo assim por aí. 

— Pra que precisam de mim se tem esse livro sobre tudo ambulante com vocês? — questionou o guia, impressionado com Jon.

— Só posso decorar informações que leio e mapas, mas eles não especificam como é a região em detalhes, irregularidades, ameaçadas do percurso, ou sequer são atualizados anualmente. Você é bem mais útil do que eu aqui — Embora ele mesmo estivesse falando, Jon parecia meio desapontado com sua limitação.

— Rápido, estão chegando perto! 

Não havia dúvida nisso, já que o barulho de vários animais correndo já podia ser ouvido por uma pessoa normal. Deviam estar fugindo dos teleportadores também.

Conforme Joanne tocava os cavalos, e a carruagem seguia a toda velocidade, a chuva aumentou, deixando o solo enlameado rapidamente.

— Não dá para ir mais rápido que isso, a carroça está quase atolando! — gritou Joanne.

— Amit está a menos de 500 metros, vamos!

A respiração de Jon estava ficando bastante ofegante devido ao nervosismo, mas isso não impedia sua curiosidade. Ele estava com a cabeça para fora da janela da carruagem, tentando ver os teleportadores.

Maldita chuva, só vejo a silhueta de uma criatura de quatro patas e corpo fino.

Os portões da cidade de Amit estavam a menos de 200 metros agora, e os teleportadores finalmente haviam sumido.

— É impressão minha, ou eles estavam nos perseguindo? — Arian estava olhando para trás, ainda procurando as criaturas.

— Parece que a tal árvore realmente funciona — falou Jon, aliviado. Ele então voltou sua atenção para a cidade a sua frente.

Amit era toda cercada por um muro baixo de madeira e pedra. A cidade ficava colada em uma montanha com uma superfície formada por uma rocha escura. No topo da montanha, à beira de um enorme precipício, havia um castelo negro e desgastado pelo tempo, onde o lorde responsável pela cidade morava.

Ao se aproximarem dos portões da entrada, os olhos de todos foram atraídos pelo castelo ao fundo da cidade, iluminado vez ou outra pelos vários raios da tempestade. A visão não era nada atrativa.

— Por Alizen, se soubesse que o local era assim, teria preferido acampar. Não visitei muito do Sul, mas do pouco que já vi, posso dizer que essa é uma das cidades com aparência mais macabra.

— Veja pelo lado bom, parece que vamos descobrir se a tal lenda das mulheres de cabelo curto é mesmo verdade. — Arian olhou para Jon, esposando um sorriso desafiador. 

— Está com medinho, Irene? — provocou Lara.

— Olha quem fala, você está tremendo, nanica.

Lara de fato parecia nervosa, observou o guia, que sem pensar, acabou falando:

— Ela não se dá bem com escuridão, ou qualquer tipo de coisa assustadora… — Ao ver os olhos furiosos da garota para ele, completou. — Digo, pelo menos é o que parece.

— É bem por aí mesmo. Toda noite ela usa magia para criar luz ao acordar assustada por causa do barulho de algum animal. Se for dormir perto dela, tem que colocar o cobertor na sua cara se não quiser ser acordado toda hora. Tanto poder da celestial em uma criatura com medo do escuro é até irônico.  — disse Joanne, se aproveitando que Lara estava apreensiva demais com o clima sombrio daquela cidade para responder. — Zek, coloque o seu elmo, se o que falaram é mesmo verdade, você vai chamar atenção.

Ela obedeceu Joanne e o grupo seguiu pelos portões, entrando na cidade sem grandes problemas.

Haviam apenas 3 regras no quadro da entrada:

  1. A cidade não se responsabiliza pelo desaparecimento de mulheres de cabelo curto. Caso ocorra, não adianta pedir auxílio para a guarda da cidade.
  2. Mulheres de cabelo curto são proibidas em determinados estabelecimentos, não insistam.
  3. Qualquer crime cometido dentro da cidade será julgado pela guarda e leis da cidade de Amit, e não pelas leis do Sul. Visitantes que tentarem interferir nos julgamentos serão retirados da cidade a força, ou presos.

— Até as regras dessa cidade são estranhas… — comentou Jon.

Nesse local não havia necessidade de deixar os cavalos na entrada, como em Amira, os estábulos para guardar os animais costumavam ficar nas estalagens da cidade em vez disso.

A cidade era bem simples, com construções de madeira em sua maioria. Como estava chovendo, as ruas estavam quase vazias, só com algumas poucas pessoas usando capas de chuva. Assim que chegaram perto do centro, onde havia o maior hotel do local, Arian começou a ficar incomodado, olhando de um lado para o outro sem parar. Parecia inquieto desde que entraram na cidade, mas só foi piorando conforme adentravam as ruas. Quando já estavam perto do hotel, parou e falou com Kadia:

— Kadia, quantas pessoas está vendo?

Kadia começou a usar os dedos para contar novamente, até parar e olhar para cara do Arian, desconfiada.

— Espera, não está tentando me fazer passar vergonha… 

— Quantas pessoas está vendo nessa rua, Kadia?! — Arian parecia bastante preocupado.

— Umas 12. 

— Quantas das mulheres têm cabelo curto?

— Não sei, estão com capas… Ei, o que houve? Por que essa cara?

— Eu estou vendo muito mais que 12, e várias mulheres de cabelo curto, sem capa de chuva, todas encarando Zek…

Próximo: Capítulo 3 – Amit

Ilustrações de base:

Cidade de Amit