As Crônicas de Arian – Capítulo 20 – A demônio curiosa

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Capítulo 20 – A demônio curiosa

Kadia estava deitada em sua cama, em uma das pousadas mais afastadas do centro da cidade. Era noite, algum tempo depois da sua luta contra Arian.

“Será que ele está bem?”, pensou ela. Não tinha certeza do que estava sentindo, mas era uma sensação semelhante a estar em dívida com alguém. Primeiro o caso da humilhação da mulher de espada e escudo, e depois quase o matou por achar que ele iria revelar que ela podia ler mentes. Tinha que pedir desculpas de alguma forma, já era a segunda vez que o interpretava errado.

O costume de resolver tudo lendo mentes sempre facilitou sua vida, então ficou frustrada ao notar o quão péssima podia ser em uma situação normal, onde não pudesse usar seus poderes para saber o que falar, e como agir. Por outro lado, podia finalmente ser sincera consigo mesma, o que era fascinante. Estava experimentando pela primeira vez a sensação de dúvida, nervosismo e expectativa ao lidar com uma pessoa, como quase todos os humanos faziam ao longo da vida.

Decidiu então ajudar Arian na próxima luta, como um pedido de desculpas pelo que fez até ali. Já viu aquela magia de Dorian antes, e sabia como bloqueá-la. Mas seria isso útil? Na situação de Arian, seria difícil conseguir lutar na final. Podia fazer um pacto temporário com ele, que o curaria bem mais rápido, mas ele dificilmente iria aceitar, devido ao efeito colateral.

Ficou surpresa quando chegou na ala hospitalar da Arena e ele estava bem. Ainda mais fascinante, ela estava se sentindo feliz por isso, provavelmente porque queria vê-lo lutar na final. Deixou a proposta do pacto para lá e passou apenas a dica sobre Dorian. Ficava sem jeito de falar com ele por não conseguir saber o que estava pensando. Era algo novo para ela, e ainda não sabia exatamente como lidar. Algo sobre uma mulher em um manto azul e cabelo loiro, foi a única coisa que conseguiu tirar dos seus pensamentos superficiais.

No dia seguinte, a mulher dos sonhos de Arian estava na sua frente, literalmente. Kadia sentou atrás do grupo da garota loira, na arquibancada reservada aos Vips. O preço daquele lugar era caro, mas não o bastante para fazê-la querer ir para a arquibancada popular, onde teria que aturar aquela multidão de pensamentos.

A loira de capuz azul parecia conhecer Arian, mas tinha treinamento, não conseguia ler sua mente com clareza para saber detalhes.

A luta foi sensacional, Arian tinha superioridade técnica, mas Dorian conseguia disfarçar muito bem seu uso de magias, a cada momento usando de um truque diferente. Ela sempre admirou criatividade, mesmo que sendo trapaça. Arian, que lutava da forma bem simples e honesta, não sabia lidar direito com aquele tipo de luta, o que tornava tudo ainda mais interessante.

Foi então que a luta virou, quando Arian tirou novamente a espada que usou para derrotá-la. O que era aquela espada? Como ele conseguia movê-la tão rápido? Era como se não tivesse peso na sua mão, mas quando encostava na espada do rival parecia exercer o peso de uma espada comum para o tamanho… Quando a luta parecia ganha para Arian, Dorian conseguiu virar novamente. Usar a própria areia da Arena para encobrir seu uso de magia. “Brilhante”, pensou ela. Muitos pensariam que foi só um vento comum passando pelo local que levantou a poeira. Sua visão, no entanto, era muito melhor que a humana, e ainda tinha noção do que estava acontecendo ali no meio.

— Arian! – gritou sem notar, junto a loira na arquibancada. Mas ela usou um outro nome.

Arian fora jogado no muro que separava a Arena da arquibancada, e Dorian começou a arremessar lanças finas de metal, até prender o adversário na parede. A próxima foi em direção a seu peito, mas ele bloqueou. Não sabia como, parecia impossível naquela situação. A fumaça no meio da Arena aumentou ainda mais, não dava para ver nada direito. Foi então que começou a pegar pensamentos soltos.

— Isso está ficando perigoso. Devo interromper?

— Ele ainda está sob controle… É o que o amigo dele está pensando pelo menos. Mas se prepare para pular.

Amigo dele? Foi então que Kadia viu Marko na parte mais à frente da arquibancada VIP, ele parecia bem mais atento, e sério, do que das outras vezes que o viu. Estava pensando repetidamente: “mantenha o controle, mantenha o controle, mantenha o controle! ”.

Voltou a pegar pensamentos soltos depois disso, de onde estavam vindo? Eram muito mais sonoros que o da maioria das pessoas na sua frente.

— Parece que ele só consegue manter o controle por um curto período de tempo depois que ocorre.

— É uma possessão?

— Não tenho certeza, nunca vi nada parecido com isso.

Kadia finalmente identificou de onde estavam vindo as vozes. O homem de cabelo preto e armadura grafite, com quem ela tinha lutado nas eliminatórias, estava conversando mentalmente com três mulheres, uma sentada à sua direita, que lembrava uma elfa, mas tinha um cabelo preto longo e olhos amarelos, e uma loira à esquerda, com cabelo caindo até a cintura e olhos azuis bem claros. Uma mulher de cabelo avermelhado estava atrás deles, fazendo a conexão mental entre o grupo, então dava a sensação que as vozes saíam todas dela, por isso acabou chamando tanto sua atenção.

— Consegue pará-lo sem mim, Lan? — parecia a mulher de vermelho falando, já que ela olhou na direção do homem à sua frente.

“Lan? Espera, o nome dele não era Sigfrid?”, pensou Kadia rapidamente. Ao menos foi como ele se registrou.

— Não sei. Se for igual o Karus, como parece, vou precisar de tudo e mais um pouco para pará-lo, então, por favor, não brinque de alterar o fluxo do pacto como fez durante minha luta na Arena, Amira, ou vou acabar morto.

— Você não tem permissão para isso, enquanto eu viver. — A elfa de cabelo preto, com um olhar sério, e rosto meio inexpressivo, aproximou sua cabeça a do homem a seu lado, até os narizes se encostarem. O homem sorriu, e encostou sua testa na dela. A relação dos dois era fascinante, dava para ver o quanto gostavam um do outro só pelo modo como se olhavam, ainda que a elfa parecesse não conseguir demonstrar isso muito bem com expressões. Sentiu um pouco de inveja imaginando se poderia ter uma conexão profunda como aquela com alguém um dia.

— Falem por vocês, eu consigo pará-lo sozinha. — Agora era a loira, com um vestido branco, falando. Parecia incomodada de ter sido deixada de lado.

— Ele não vai parar só de olhar os seus peitos Lux — respondeu a elfa de cabelo preto, com um olhar apático.

O tal de Lan começou a rir sem parar, assim como a mulher de cabelo vermelho atrás dele. A loira ficou possessa, olhando para a elfa como se quisesse arrancar sua cabeça… Mas, era mesmo uma elfa? Difícil dizer, algum tipo de demônio que desconhecia era mais provável.

A loira era uma celestial. Humanos não podiam ver, mas as asas brancas em suas costas entregavam na hora. Apesar das marcações em dourado nas penas serem novidade para Kadia, as asas de celestial que viu até hoje eram completamente brancas. A mulher de cabelo vermelho atrás deles não era humana também, mas nunca viu nada parecido com ela, tinha uma presença muito diferente. O homem parecia um humano comum ligado por um pacto a elfa ao seu lado, mas tinha alguma coisa errada com ele, só não sabia exatamente o que.   

— Bisbilhotar a conversa dos outros é feio…

Kadia arregalou os olhos. A mulher de vermelho ainda estava falando mentalmente, mas olhando para ela. Estava com um sorriso gentil no rosto, mas Kadia sentia como se a mulher fosse matá-la a qualquer instante. Engoliu seco e tentou desviar o olhar, se voltando novamente ao combate. Estava muito curiosa com o que era aquele grupo exótico, mas ao mesmo tempo, com medo de acabar morta. Seja o que fosse aquela elfa de cabelo preto, ou a mulher de cabelo vermelho, não pareciam existências que poderia enfrentar.

Pelo barulho e movimento no meio daquela fumaça, Dorian e Arian deviam estar lutando. Pouco depois, viu o mago sendo arremessado para fora da fumaça, e logo depois se rendeu.

Arian parecia exausto, e com um ferimento grande no ombro, mas venceu. Estava feliz por ele, mas riu sem parar por algum tempo quando ambos foram desqualificados. Como Marko se recusou a lutar pelo terceiro lugar, ela acabou ganhando o prêmio.

Assim que recebeu o ouro, e a elfa, foi procurar Arian fora da Arena. Ele estava a aguardando, claramente querendo fazer uma proposta pela elfa. Não precisava, seria a forma perfeita de pedir desculpas pelos maus entendidos dela. E de bônus podia tentar convencê-lo a deixar que fizesse algo que desejava desde que o conheceu. Mas quando ia fazer a proposta, um amigo de uma antiga guild de Arian a interrompeu, e depois a mulher loira de manto azul chegou.

A garota era bizarra, aparentava uma coisa e pensava outra. Parecia calma, mas estava bem ansiosa internamente. Ficou frustrada de Arian não lembrar dela, mas se esforçou ao máximo para não aparentar. Também queria beijá-lo, mas o abraçou em vez disso, já que estava insegura quanto a reação dele com a aproximação agressiva. Lara era treinada para bloquear leitura de mentes, então só conseguiu pegar o mais superficial, mas definitivamente havia uma sensação de desespero dela em criar um vínculo com Arian.

Decidiu seguir Lara e a mulher que a estava puxando, Joanne. Uma missão longa juntos era a chance perfeita para conseguir o que queria de Arian. Sabia que eles precisavam de mais gente, e se ofereceu por um preço até mais barato do que estavam dispostas a pagar. Dinheiro não a interessava.

Infelizmente, teria pedido mais se soubesse que Joanne iria exigir que ela comprasse uma espada mais cara que o normal para essa missão. Arian quebrou sua espada, mas já tinha comprado uma nova bem barata. O modo rústico que ela usava armas fazia com que quebrassem com frequência, então evitava qualquer espada mais cara.

— Muito bem, se ganhar de Lara pode ficar com sua espada. Se perder, compre uma nova melhor.

— Ela é meio pequena, não tem medo de eu machucá-la? — falou Kadia, com um olhar confiante para Lara.

— Sua espada de brinquedo vai quebrar antes de conseguir encostar em mim — disse Lara em um tom ríspido.

Kadia sorriu, ao notar que pela primeira vez o que Lara dizia estava batendo com o que estava pensando.

Apesar da aparência frágil, Lara lutava melhor que ela, e para piorar, tinha uma espada especial. Era linda, toda em um metal branco, e ficava emitindo uma fumaça. Era como se fosse um pedaço de gelo emitindo vapor. Tinha uma joia azul perto do punho que brilhava o tempo todo, ficou imaginando o quão cara devia ser. Ao primeiro toque daquela arma na espada de Kadia, o metal ficou frio como uma pedra de gelo, no segundo toque trincou, e no terceiro a lamina quebrou em pedaços, como se fosse vidro. Fora completamente humilhada pela garota.

— Viu? Por isso falei que precisa de uma espada mais resistente. O trato está feito, mas tem que aparecer com uma espada decente no dia que partirmos. Obviamente, não precisa ser uma arma espiritual como a de Lara, mas compre algo pelo menos resistente à magia — disse Joanne.

Não teve como discordar. Mas se iria gastar uma fortuna em uma espada decente era melhor encomendar uma com as especificações que queria. Mas em três dias, será que ficaria pronta?

Foi para a maior loja de armas da cidade ver suas opções. Uma arma espiritual seria legal, sempre sonhou em ter uma com super resistência, que não quebrasse em pouco tempo de uso. Ao observar a loja viu uma espada enorme no mostruário, devia ter um pouco mais de 1,30 metros de comprimento. Os olhos dela brilharam quando leu as especificações:

“Tarrask Blade – Criada a partir das presas de um Tarrask, e com sua alma aprisionada, tem poder de corte muitas vezes maior que uma espada comum. Espadas normais são quebradas instantaneamente ao toque, cria ondas de choque, repele magia, e é quase indestrutível. Mesmo se sofrer uma fissura, se regenera sozinha em menos de um dia”. 

— Quanto custa aquela espada com alma de Tarrask? — perguntou ao vendedor.

— Aquela está reservada para um nobre. Ele pagou 100.000 moedas de ouro.

Kadia arregalou os olhos, levaria uns 200 anos ou mais até ter o bastante. Ao ver a expressão dela, o homem riu.

— Todos têm essa reação, mas nem foi muito. Uma Archor, Lâmina de dragão, ou as quase extintas Lâminas do Sol, custam umas cinco a dez vezes esse valor. 

— Compram mesmo armas a esse preço? Dá para comprar vários castelos ou uma pequena cidade com tanto dinheiro.

— Bem, dizem que leva-se anos e muitos especialistas para transplantar almas de animais lendários e criar as armas através de pedaços de seus corpos, então é um custo justificável. 

— Parece que não vai ser hoje que vou conseguir uma dessas… Certo, preciso de algo com zodium o bastante para bloquear magia. E uma espada de 2 mãos, odeio as pequenas, quebram muito rápido.

O homem lhe trouxe o pedido. Não era uma arma incomum, então costumam ter em estoque.

— 30 moedas de ouro.

— Isso não está meio caro?

— Claro que não.

Kadia fez uma cara de mau humor ao pegar os pensamentos do homem. Estava contando com o fato que ela parecia nova na cidade para lhe passar um preço acima do padrão. O correto seria…

— 20 moedas.

— Assim eu saio no prejuízo, o máximo de desconto que posso dar é 28.

O homem estava rindo internamente, comprou aquela espada por 15 moedas de ouro de um ferreiro.

— 15 ou eu conto a sua mulher que está traindo ela com sua assistente.

Uma mulher, bem próxima, à direita do homem, e conversando com um cliente, congelou, ao mesmo tempo que o dono do local arregalou os olhos.

— Do que você…

—  Bia vai adorar saber o que vocês fazem toda noite no armazém da loja…

— 15 moedas, fechado! — falou o homem em um tom de desespero.

— Espero que você dure mais que as outras…  — disse Kadia, olhando para a espada, de aproximadamente 1,2 metros.

— Atenção, estamos fechando mais cedo essa semana, até encontrarem aquele tal de cavaleiro da morte que está na cidade. Quem ainda não decidiu o que comprar, por favor, volte amanhã  — anunciou o gerente da loja.

— Não vejo necessidade, ele só atacou um prostíbulo e um mercado de escravos no centro da cidade, até agora. Não parece ter interesse nesse tipo de loja  — falou Kadia.

— Melhor não arriscar…

Depois disso resolveu ir atrás de Arian. Queria tentar aprender algo sobre ele que ajudasse nas aproximações futuras. Pesquisou indiretamente, lendo a mente de quem conseguiu na taberna da guild antiga dele, a Scarlet Dragons, mas só conseguiu informações vagas. Então apelou para o bom e velho bate-papo para a presa mais fácil: A tal mulher que era como uma mãe para ele, pelo que ouviu da conversa dele com os membros da guild. Cabelo castanho, uns 40 anos, ainda muito bonita para a idade. Ela administrava a taberna. Se gostava tanto de falar dele não devia ser complicado conseguir informações. Quando passou próximo de Kadia, a garota soltou a isca.

— Aquele Arian que lutou na Arena, soube que é dessa guild, é verdade?

— Sim, eu mesma o recebi faz uns 5 anos. Ele e sua irmã estavam em um estado deplorável quando chegaram aqui.

— Ele tem uma irmã?

— Bem, não é exatamente uma irmã. Era filha de um casal que o ajudou e…

A mulher travou nessa parte, claramente não querendo aprofundar esse assunto. Kadia então fez outra pergunta:

— Ele se voluntariou para a guild?

— Na verdade foi o pagamento que Banne, um dos fundadores, pediu para ele depois de salvarem os dois de mercenários. A guild era muito pequena naquela época, sendo difícil conseguir membros, e Bane ficou fascinado com alguma coisa que Arian fez. Eles não tinham para onde ir ou dinheiro, então aceitaram de bom grado. 

— Tem ideia de qual a raça dele?

— Humano…

Kadia fez uma cara de cética, dando a noção de que tinha certeza que era mentira.

—Bem… nem mesmo ele sabe. Trouxemos um bando de especialistas para examiná-lo, e nenhum conseguiu descobrir o que ele era.

Depois disso a mulher começou a contar sobre algumas missões que ela participou junto com ele, e como ele subiu rapidamente de rank na guild. Mas aquilo não lhe interessava muito, queria dicas de como ele bloqueava sua leitura de mentes, não suas aventuras. Até porque, a mulher tomava cuidado para não revelar nada muito íntimo. Saindo de lá, Kadia foi espionar seu alvo.

A rotina de Arian enquanto aguardava o dia da missão de Joanne era simples, ficando a maior parte do dia na estalagem que alugou. Em um dos dias foi visitar a guild a que pertencia, levando a elfa, Nya. Uma coisa estranha que notou é que ele só bebia água. Seu amigo parrudo, por outro lado, passava o dia todo bebendo álcool.

Tinha um outro mistério que a intrigava há algum tempo, e não parecia ter nem sinal de resposta. Com quem ele ficava falando quando estava sozinho? Ele parecia mais relaxado e feliz sempre que o fazia. Até chegava a rir sozinho. Primeiro pensou que ele podia ler mentes como ela, mas depois notou que era como se tivesse alguém perto dele o tempo todo. Ele estava sempre inconscientemente olhando a sua volta, como se estivesse de olho em alguém. Um espírita? Já ouviu falar sobre, podiam ver fantasmas. Esse homem ficava mais interessante quanto mais observava. 

Parecia ter interesse por cavalos também, ficou horas conversando com o vendedor e discutindo com Marko sobre eles no estábulo principal da cidade.

— Não seria uma boa ideia comprar um cavalo melhor? Essa porcaria que te deram naquele vilarejo parece um mestiço bem fraquinho.

— É tentador… Mas mesmo que eu deixe ele aqui de graça para o dono do lugar, ninguém vai comprá-lo. Fico com pena…

— Você tem problemas homem… Como consegue ter mais empatia com cavalos do que com humanos?… Falando nisso, que aconteceu com o Nightmare?

— Hum… Se apaixonou e decidiu virar um pai de família… Mais ou menos isso.

— Uma pena, sempre quis um cavalo monstruoso como aquele. Era lindo, e provavelmente me aguentaria sem suar.

“Pera, eles estavam mesmo falando daquele Nightmare, ou era apenas o nome do cavalo?”, pensou Kadia, enquanto fingia observar alguns cavalos, a uma certa distância dos dois.

— Ele conseguiu puxar 5 carroças cheias de pessoas por 3 dias ininterruptos, carregar você não seria nada. De qualquer forma, se fosse uma missão mais urgente eu pediria a guild um White Astalon, mas para essa, que não devemos correr muito, esse mestiço deve aguentar.

Parecia ser mesmo o cavalo que ela estava pensando. Não conseguia imaginar aquelas criaturas servindo a um humano. Mas um cavalo normal nunca conseguiria puxar cinco carroças… “Devo ter ouvido errado”, pensou.

Quando não estava os espionando, ia para uma loja de animais de estimação. Os donos ficavam bravos com as constantes visitas sem ela nunca comprar nada.  Adorava todo tipo de animal, eles pensavam pouco e de forma primitiva. Gostava muito de cachorros e gatos, mas o que estava namorando há dias naquela loja era um falcão negro de olhos amarelos. O problema é que o preço dele era absurdo. Algumas noites saía para tentar ver se tinha sorte e dava de cara com o tal cavaleiro da morte, que diziam estar na cidade. Estava curiosa para saber se era mesmo um espírito ou apenas uma pessoa. Não teve sorte, no entanto.

Chegado o dia da missão, Kadia comprou um cavalo negro que considerou ter um bom custo benefício e foi para a saída da cidade. Acabou adquirindo o falcão negro que estava de olho também, o que a deixou quase zerada em dinheiro.

Perto do portão norte, deu de cara com um rosto familiar.

— Olha quem está aí, a bisbilhoteira de mentes… Hum, vejo que tem apreciação por preto…

Sua preferência por cores era meio notória. Desde sua roupa, cavalo e sacos com mantimentos no cavalo, fazia questão de tudo ser preto, incluindo seu novo animal de estimação, no momento empoleirado no meio da bagagem, nas costas do cavalo de Kadia.

Marko estava passando a mão no próprio rosto, e tendo pensamentos bem safados enquanto o fazia.

— Você sabe que eu posso ler mentes, certo?

— Estou contando com isso — disse ele, pensando com todas as forças em como Kadia era debaixo daquelas roupas.

— Infelizmente para você minha adoração por preto se limita a objetos…

— Pode mentir para mim, mas não para si mesma.

— Vamos passar vários dias juntos, então com certeza descobriremos sobre isso…

— Vai na missão também? Vou estar cercado por aquelas loiras lindas e por você? Estou começando a me sentir culpado de estar sendo pago.

Kadia não aguentou e começou a rir. Embora um canastrão, e claramente receoso com a habilidade dela de ler mentes, Marko estava fazendo o possível para ser simpático, do seu próprio jeito.

— Parece que vou estragar sua festa grandão.

Os dois olharam para trás, onde viram um rosto conhecido.

— Só pode ser brincadeira…

Resmungou Marko, enquanto Kadia fazia uma cara de curiosidade, sobre o porquê daquela pessoa estar ali.

Próximo: Capítulo 21 – O Começo

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