Impressões semanais: Etotama 9

Uma paródia de animes de competição

-Não precisei pensar muito para perceber que a proposta do episódio era justamente ser uma paródia de animes “competitivos”, dentre os quais podemos incluir esportes de mobilidade – como basquete (Kuroko), futebol (Inazuma Eleven) e tênis (Prince of tennis) – jogos de cartas – como Yu-gi-oh! e Card Fight Vanguard – e jogos de tabuleiro – Majhong (Saki) e Go (Hikaru no go). Não assisti os dois últimos, então vou usar Yu-gi-oh! como base de comparação, já que ele está mais próximo de um jogo de tabuleiro do que os outros.

-Pode-se perceber, tanto em Yu-gi-oh! como em quase todos os animes competitivos existentes, que uma atmosfera de intensa seriedade paira sobre o ambiente e também sobre todas as personagens. O esporte/jogo é tão importante que alguns chegam a alcançar níveis de tensão que extrapolam o senso comum, vide a personagem Keith Howard (Yu-gi-oh!), que sequestra a personagem Mai Valentine para o sórdido fim de…duelar com ela (recomendo assistir YGOTAS no youtube, muito legal). Aqui é a mesma coisa, “o Shogi é o universo”, não existe nada mais importante que o Shogi, ele é a base de todo o pensamento racional e de toda a ciência humana ou algo assim. É quase como se todos os problemas pudessem ser resolvidos em um duelo de cartas ou uma partida de Shogi, um enlevo surreal da existência.

Treinamento shounen

-A cultura japonesa (ao menos aquela que é característica dos meios televisivos, e serve de inspiração para filmes ocidentais e animes) está carregada de uma milenar tradição que gira em torno da relação “mestre-discípulo”, o que hoje em dia, com a modernização que ocorreu no século XX, sintetiza-se pela relação “professor-aluno”. Na mídia, é claro, a figura do samurai e de seu mestre mantém sua popularidade de outrora, e outro artifício bem explorado por animes competitivos (mais comum em animes de luta) – além do respeito pela figura do mestre – é o treinamento. Ele pode ser levado a sério ou parodiado.
Provavelmente referência de alguma cena de algum anime
-Óbvio que o que temos aqui é o segundo caso, em que o treinamento se assemelha mais àquelas provas dos programas do Sílvio Santos (corda bamba, completar o circuito sem cair na água, entre outros) do que a um treinamento de verdade. Eles realmente tiveram criatividade, principalmente nas partes da “batalha naval”, em que a Nya-tan tinha que adivinhar o próximo movimento e desviar de uma lança, e naquele de jogar shogi enquanto amarrada em uma árvore. Outro exemplo de treinamento parodiado que chega a ser bizarramente divertido é Aikatsu!, anime de idols em que que inclui atividades como escalar montanhas, descer encostas em um tronco de árvore e rastejar na grama enquanto um ventilador gigante te empurra de volta.

Mudança, retorno e internalização

-Ao fim do treinamento, a Nya-tan não parecia mais ela mesma, e sim outra pessoa de personalidade completamente oposta. De fato, talvez essa seja a primeira vez no anime em que pode-se dizer com certeza que ela empreendeu um esforço de forma honesta e trabalhosa para conseguir o que queria, ao invés de utilizar-se de artifícios, chantagens e falcatruas. A princípio, tem-se a impressão de que a velha Nya-tan submergiu completamente para dar lugar à nova e melhorada Nya-tan, mas essa afirmação só está correta em parte.
-Quando você vai para uma entrevista de emprego, você usa gírias ao falar com o entrevistador? Se eu for dar aula, eu posso conversar como se estivesse entre os meus amigos e falar palavrões a rodo? Claro que não, o que eu vou fazer é colocar um sorriso falso na cara e atentar para a postura corporal e o contato ocular direto, sem ficar brincando muito e mudando o tom de voz quando necessário. O mesmo vale para a Nya-tan, que ao jogar shogi, comporta-se exatamente como uma jogadora de shogi se comportaria, reprimindo as emoções (manifestações externas, não confundir com “sentimentos”) e comunicando-se por meio de provérbios típicos do jogo. É o que a sociologia chama de “papeis sociais”, que define-se como o conjunto de “máscaras” utilizadas por um indivíduo em cada situação no seu cotidiano. Isso é tão verdade que ao final do anime, o próprio Takeru percebeu que a Nya-tan não havia mudado suas bases de comportamento, mas sim expandido a variedade de expressões para se adequar a uma situação específica. Ela internalizou aquilo que aprendeu e, portanto, expandiu a consciência.
PS: Uma coisa que eu não tinha percebido no episódio da Usa-tan é que ela poderia estar parodiando a indústria de talentos, principalmente cantores e idols, e ao mesmo tempo parodiando as escolhas de designs em animes como forma de atrair maior público.