As Crônicas de Arian – Capítulo 35 – A demônio frustrada

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Capítulo 35 – A demônio frustrada

— Quando vir a Lara de novo, eu mato ela! — disse Joanne, suando frio, enquanto segurava um objeto preto e quadrado, cheio de inscrições, junto com Zek. — Isso também é culpa sua Irene.

— Como eu ia saber que ela fingiria ir ao banheiro e depois pularia pela janela do quinto andar, deixando a relíquia para trás? — Irene estava olhando pela janela do quarto.

— Por que o Arian a ajudou, afinal? — perguntou Kadia, que tinha vindo correndo para o quarto delas, assim que escutou os gritos.

— Ela sabe coisas do passado dele… não preciso ler mentes para desvendar essa — disse Joanne, tentando forçar uma risada.

— Zek, qual o seu problema? — perguntou Irene, vendo a garota com um olhar distante. Diferente de Joanne, não parecia estar sofrendo enquanto encostava na relíquia.

— Sabem onde o Jon foi? — perguntou ela, desanimada.

— Eu o vi saindo com Dorian e Marko, quando fui pegar o almoço no bar. Ele está seguro com aqueles dois, não precisa ficar tão neurótica só porque falei para ficar de olho nele.

— Joanne, você não notou, ou só está fingindo? — perguntou Irene, olhando ela com um olhar desafiador.

Joanne parecia confusa com a pergunta.

—  Pobre rato de livros… —  disse Irene, balançando a cabeça, enquanto voltava a observar a rua.

— Não o chame assim — reclamou Zekasta.

Joanne achava incrível como Zek podia ficar brava sem transparecer isso no rosto.

—  Zek, está levando o papel de guarda costas do Jon longe demais.

—  Por Alizen, Joanne! Não é as costas do Jon que ela quer, mas sim o…

Zek saltou para cima de Irene e tapou sua boca antes dela completar a frase. A garota fez um olhar tão agressivo que Irene decidiu não reagir, só levantou as mãos, como se estivesse dizendo que entendeu o recado.

— Zek, solte-a, se perdermos uma sacerdotisa vai sobrar só eu e você para dividir esse negócio até Lara voltar. E volte logo aqui, é sufocante segurar isso sozinha.

Zek soltou Irene e voltou para o lado de Joanne. Kadia estava sentada em uma das camas, as observando, provavelmente tentando ler a mente delas.

— Me digam uma coisa, não é preciso ser uma pessoa de coração puro para virar uma sacerdotisa? Eu já vi um pouco da mente da Lara e… Ela não bate com isso.

— Isso é bobagem. É igual a história que espalham de que todos os demônios com olhos vermelhos são ruins, ou celestiais são todos bons. — disse Irene.

— Qualquer um com afinidade à dimensão dos celestiais pode ser uma sacerdotisa — Joanne disse isso olhando profundamente para Kadia, e completou — Que tal se testar, Kadia? Assim que tocar esse objeto, sua mente, como forma de se defender, vai subconscientemente tentar puxar energia da dimensão dos celestiais. É mais ou menos assim que testamos a aptidão das pessoas. 

Kadia olhou para Joanne, desconfiada. Estava pegando lampejos do que ela queria com aquilo tudo.

— Não, obrigada.

— Um demônio com forte ligação com a dimensão dos celestiais? Seria engraçado…iria ser venerada na torre de luz, ou caçado até a morte pelos celestiais.

Kadia ficou pensativa por um tempo depois disso. Mas logo voltou a seu olhar distante e depressivo dos últimos dias.

— Kadia, pare de fazer essa cara, se tem um problema com o Arian fale logo com ele. Não vou aguentar mais duas semanas nesse clima, até chegarmos a Sunkeep — disse Irene.

Joanne olhou para Kadia por um tempo, e então disse:

— Kadia, o que você faria, se estivesse na situação dele? Escolheria uma pessoa que gosta, ou um bando de desconhecidos?

— Você entendeu errado. Não ligo de ele ter salvado a criança em vez das pessoas do vilarejo. Não acho errada a decisão que ele tomou, nem certa. Mas eu tinha alguém importante em Midland…

— O que o Arian tem a ver com isso?

— Segundo o que Malak falou, ele foi o responsável por metade da cidade ter sido destruída. Parece que foi o preço para salvar alguém que ele conhecia — disse Kadia.

— Então foi isso que você viu na mente da Ane… — constatou Joanne.

— Era um familiar, ou amante seu? — perguntou Irene.

— Minha família, ou o que sobrou dela, não está neste mundo… Mas lembra do homem que eu disse ter pego aquelas memórias horríveis, de um tempo em que foi torturado? Ele me deu onde morar e me ajudou, quando cheguei nesse mundo. Ele é… era, a melhor pessoa que conheci até hoje, nunca vi uma mente tão pura e honesta. — Kadia sorriu levemente, enquanto contava sobre o sujeito. — Quando ele ficou bem velho, eu já tinha juntado bastante dinheiro, e comprei para ele uma casa luxuosa em Midland, onde ele dizia ter o sonho de morar, desde que o conheci. Eu passava a maior parte do tempo viajando pelo continente central, mas o visitava de vez em quando. Alguns anos depois, no entanto, metade da cidade foi destruída, incluindo a casa onde ele estava… — Kadia passou a mão rapidamente na lágrima que caiu de um de seus olhos. — Agora, eu te devolvo a pergunta, Joanne: O que faria se descobrisse que uma pessoa que você conheceu há pouco tempo, e sabe que não é ruim, foi o responsável por matar alguém que você gostava muito? 

— Não faço ideia… Mas… Posso sugerir algo?

Kadia balançou a cabeça. 

— Imagine que tem que escolher entre esse homem que você gostava, e metade das pessoas de Midland. E também que exista alguém que o Arian gosta muito, entre essas pessoas de Midland que vão morrer, caso você escolha o homem. O que você faria?

Kadia abriu levemente a boca, surpresa. Joanne sorriu, ao notar que tinha sido efetivo. 

— “Tente se colocar no lugar da outra pessoa…” Não lembro mais onde li isso, mas acho que é da época que ainda morava em um orfanato. Não tinha nada para fazer, então ficava o dia todo na biblioteca da cidade. De qualquer forma, Arian prioriza quem ele gosta sobre qualquer coisa. Ele provavelmente faria a mesma coisa de novo, mesmo que se sentisse mal por você.

Kadia ficou pensativa por um tempo. Mas não parecia tão desanimada, só confusa.

— Livros são mais úteis do que imaginei… — disse Kadia, rindo.

— Infelizmente, eles não consertam sua personalidade. E graças a ela, não consigo manter um namorado, ou uma conversa longa sem espantar meus pretendentes… É pedir demais um homem culto, valente e que aprecie minha comida?

— Desista da última parte! — disse Kadia e Irene, ao mesmo tempo.

Zek começou a rir depois disso, para a surpresa do grupo. Até a forma de rir dela era estranha, já que o rosto não mexia muito.

— Então, vamos atrás da Lara ou não? — perguntou Irene.

— É inútil. Eu odeio admitir isso, mas somos reféns da boa vontade dela, a não ser que vocês queiram carregar isso juntinhas comigo o resto da viagem toda.

— Não tinha mais ninguém que aguentasse isso sozinha? — perguntou Kadia.

— Não, infelizmente, aquela criança mimada é a única que consegue conter esse objeto sozinha por tanto tempo. Se Alizen realmente a abençoou ou escolheu, tenho sérias dúvidas quanto a sanidade dela.

— Lara sempre foi assim? Digo… — Kadia não sabia bem como definir Lara. 

— Só pensa nela mesma? Sim, se não for importante para ela, cuidado, porque não vai te ajudar, mesmo em uma hora crítica.

— Mas a criança meio-elfa…

— Adoraria dizer que ela fez aquilo por ter um bom coração, mas a verdade? Tenho quase certeza que só queria cair nas boas graças do Arian.

Kadia pareceu meio chocada com a resposta.

— E então, o que vai fazer com o seu dilema? — questionou Joanne.

— Não sei ainda. Não tenho raiva dele, mas também não consigo fingir que nada aconteceu… — disse ela, contraindo os lábios.

— Sei que pode parecer irrelevante, mas ouvir um pedido de desculpas sincero, por mais que sejam só palavras, às vezes, funciona.

— É… Acho que vou fazer isso, quando ele e Lara voltarem…

— Do encontro… — completou Irene.

Joanne tacou um travesseiro na cabeça dela.

— Preciso ir no banheiro — disse Zek.

— Que tédio… — disse Irene, olhando pela janela. — Ei, acho que tem alguém nos espionando…

Kadia levantou e foi até a janela. Seus olhos estavam completamente dourados. 

— Ele foi mandado para confirmar a localização do objeto — disse ela, lendo a mente do sujeito no telhado de uma construção próxima. Kadia então saltou pela janela. 

— Zek, vá ajudá-la e tentem capturá-lo. Se não conseguirem, matem-no — Zek correu para pegar sua espada e depois saltou pela janela, indo parar no telhado da construção que ficava ao lado da Guild. 

— Por que não me mandou? Meu arco talvez seja mais efetivo — questionou Irene.

— Em termos de combate, Zek é muito superior a você. Agora venha aqui me ajudar a segurar esse negócio.

Irene obedeceu, fazendo uma cara de preocupação, enquanto tocava no objeto negro.

— Espero que a Lara volte logo, não tenho um bom pressentimento quanto a isso. 

Próximo: Capítulo 36 – A Floresta de Ark

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