Yahari Ore no Seishun Love Comedy wa Machigatteiru e uma tentativa de desconstrução da comédia romântica?

B-baka, rostos corados, triângulos amorosos… só que não.

Esse review contém alguns spoilers, mas nada que comprometa quem ainda não assistiu ao anime.

Yahari Ore no Seishun Love Comedy wa Machigatteiru ou Ore é originalmente uma Light Novel adaptada pelo estúdio Brains Base (Durarara!!, Baccano!) que conta a história do antissocial Hachiman Hikigaya após ser obrigado por sua professora a entrar para um clube de “serviços voluntários” onde a popular por suas notas e antissocial Yukino Yukinoshita preside. Logo a meiga Yui Yuigahama entra para o clube completando o time e os três dali em diante passariam a tentar resolver problemas dos outros alunos da escola ao mesmo tempo em que Hikigaya aprenderia a se socializar melhor.

Nada de inovador nessa sinopse, mas nem sempre a primeira impressão é a que fica. Afirmo isto, pois depois de um primeiro episódio nada animador que até comentei aqui eis que ao fim OreGairu surpreende, e de uma maneira digna ao ponto de tal questionamento na chamada do post surgir em minha mente.

Continuemos o texto cumprindo mais um pouco com a parte burocrática: o que é desconstrução? Para Jacques Derrida, filósofo francês, a desconstrução não significa a destruição, mas sim desmontagem, decomposição dos elementos. É exatamente isso que OreGairu faz com seus gêneros comédia e romance. A série brinca, satiriza e modifica suas bases e regras pré-definidas há muito tempo repetidas pelas varias produções vindas do Japão e ainda traz uma abordagem de um tema pouco trabalhado de maneira mais aprofundada nos animes: a socialização.

Uma comédia simples e às vezes cruel.

Soltar uma gargalhada é algo que dificilmente OreGairu irá lhe provocar, não que as piadas sejam sem graça, se deve mais ao fato de serem bem restritas e pouco exageradas como costuma-se achar nesse gênero, mas há personagens que preenchem essa cota como o Yoshiteru Zaimokuza com seus ataques de chunnibyou ou pela divertida fujoshi Hibina Ebina e suas tentativas de ver os garotos em cenas BL. Também há ocasiões que o anime usa de flashbacks do passado nada agradável de Hikigaya para acentuar ainda mais a decadência do personagem, é como se a própria história fizesse piada do rapaz. Mas na grande maioria das vezes os episódios apresentam pouco desse elemento. Nós vemos muitos dos fatos apresentados no anime pela visão do Hikigaya (tanto que só escutamos os seus pensamentos) e um garoto que teve decepções amorosas e sociais durante toda sua vida dificilmente iria encontrar algo engraçado em seu dia-a-dia. A comédia, assim como outros elementos do anime refletem esse modo de viver e pensar dele. É por essa razão que temos a todo instante um clima sombrio, quase que depressivo e melancólico.

Aprendendo um pouco sobre a arte de se socializar.

Como comentado mais acima, temos a história vista na perspectiva de Hikigaya que devido a várias decepções que teve durante sua vida escolar acha que não precisa viver ao redor de amigos, que a mera convivência com eles é inútil. As experiências acumuladas somadas a sua ótima percepção lhe deram direito a montar uma verdadeira monografia sobre a socialização. Por essa razão espere por bastantes diálogos e  comentários pontuais a respeito.

No episódio dois, por exemplo, o rapaz está sentado em sua carteira comendo enquanto observava sua colega de classe Yui mais ao fundo da sala tentando conversar com seus amigos. Ela se aproxima e hesita em falar. Não há como uma pessoa puxar assunto com alguém que nem lhe da uma devida atenção. Se sentindo cada vez mais deslocada do grupo ela age por impulso e tenta se inserir no meio simplesmente puxando o saco da garota que era tida como a líder, a que todos cercavam. Hikigaya então pensa: “Parece uma sociedade feudal. Se é preciso fazer isso para ter amigos eu prefiro continuar sozinho.” Quantas pessoas você conheceu ou conhece na sua escola que fizeram o mesmo que ela? Quantos tiveram que mentir ou agir de maneira falsa para agradar certa pessoa ou grupo para ser aceito? O pior era que Yui estava praticamente submissa a sua colega, tendo até mesmo que lhe comunicar que iria almoçar em outro lugar. É como Hikigaya comenta, a pessoa deve se submeter à outra para poder se aproximar, há uma verdadeira divisão de classe, um sistema feudal, isso não é uma amizade.

Outros temas também são abordados como no arco onde a Yukino é desenvolvida. A mesma tem problemas quanto a sua família devido a ser vista por eles apenas como uma substituta para sua irmã em relações e negócios. Isso faz Yukino se sentir inferior e desejar sempre superar sua irmã e esse desejo acaba por moldar uma personalidade mais fechada e até mesmo parecida a de Hikigaya. Alias a relação entre os dois é bem interessante, pois apesar de suas semelhanças ambos apresentam perspectivas diferentes sobre relações sociais sempre regados por bons debates.

O lobo solitário.

Um rapaz feio, de personalidade difícil e até áspera, e sua principal característica: falar o que pensa. Esse é Hikigaya que com essa personalidade é de longe o personagem mais destacável da obra, além de ser uma das colunas para o que afirmei na chamada do post. Ele é totalmente ao contrário dos protagonistas comuns de romcom. 

No decorrer da história vamos começando a entender as razões para que Hikigaya tenha seu modo de pensar, além de apresentar até que ponto ele é capaz de chegar com suas atitudes. Em um dado episódio uma garotinha estava com problemas para se socializar com suas amigas, e Hikigaya junto a seus colegas decidem ajuda-la. Para a surpresa da maioria o rapaz chega a propor que a menina corte totalmente os laços com as garotas na qual tentava ser amiga, pois ela não correria o risco de ser enganada ou machucada como ocorreu com ele em seu passado. Mas esse seu pessimismo é só uma fachada, um sistema que ele criou para se proteger, no fundo até mesmo Hikigaya sente o peso por agir de modo destrutivo, até mesmo ele deseja ter amigos.

Qualidade técnica e adaptação.

É nesse quesito que temos o calcanhar de Aquiles de OreGairu. Muito de sua animação apresenta erros de proporção bastante evidente e que pode chegar a incomodar alguns. A inexperiência do diretor acentua mais ainda esse problema.

Seu modo de adaptar a obra, que é regada por bastantes diálogos (se assemelha, por exemplos, aos apresentados nas séries Monogatari) acaba por deixar alguns momentos maçantes de se acompanhar, além de cenas pouco inspiradas (o episódio do jogo de tênis),animações reaproveitadas (as cenas do show) ou momentos que não conseguiram transmitir todo o feeling que deveriam seja por um storyboard (quesito que define como as cenas são transmitidas do papel para a animação) precário ou pela falta de uma OST mais presente.

Espere por uma das produções mais fracas que pude conferir do estúdio Brains Base, que apesar de tudo não ofusca a qualidade do material original, mas que com certeza o torna menos atrativo.

Nota final: 07/10