Big Fish & Begônia – A fantástica produção desconhecida

Sinopse: Em um mundo dentro do nosso mundo, ainda não visto por qualquer humano,  os seres míticos que o habitam controlam  o tempo e a mudança das estações. No dia em que Chun, um desses seres, faz dezesseis anos, ela é transformada em um golfinho para explorar o mundo humano. Na volta para casa é resgatada de um vórtice por um menino humano ao custo de sua própria vida. Chun fica tão comovida com a gentileza e a coragem do menino que decide dar-lhe a vida novamente. Mas para fazer isso, ela deve proteger a alma do menino, um peixe minúsculo, e alimentá-lo para crescer. Através da aventura e sacrifício, o amor cresce, mas agora ela deve libertá-lo de volta ao mar, de volta à vida no mundo humano.

Pelo seu histórico recente com produções próprias, sabemos que a China ainda não possui um repertório tão destacado e cheio de clássicos como a animação japonesa, afinal diversas historias de Myiazaki , Hosada entre outros diretores aclamados, fizeram parte da infância e adolescência de muitas pessoas, incluindo a minha. Contudo, não se deve menosprezar o potencial que este país possui em criar obras deslumbrantes.

Big Fish & Begônia é uma aventura mística ousada que se equipara a Viagem de Chihiro em sua capacidade de encantar o público com sua narrativa delicada e a presença de um mundo sobrenatural no qual possuímos a ausência de um antagonista ou vilão central , sendo realmente um conto extremamente poético sobre amizade, sacrifícios pessoais, arrependimentos e acima de tudo, amadurecimento.

O filme também possui muitas características presentes na cultura oriental, sendo um misto de  elementos taoistas com seus diálogos recheados de metáforas e ensinamentos de mitologia, já que os Outros são claramente inspirados nas divindades chinesas da natureza , inclusive o nome dos personagens principais estão associados ao trecho de uma lenda taoista e ligado às estações do ano (Chun, primavera e Qiu, outono ).

Adoro esta relação dos personagens com as estações

E com certeza, uma das coisas que mais me atraiu em Big Fish e Begônia é toda essa filosofia embutida . O filme inteiro trabalha com a compreensão da morte como uma simples progressão natural e mesmo que sua vida termine, você viverá como uma parte do todo, do solo, da chuva ou dos ventos. Simplificando, a morte também alimenta a vida e mesmo que doloroso, é algo necessário e inevitável e tentar bular estas leis trazem desiquilíbrio e infelicidade.

O seu começo também é bastante lúdico, resgatando a velha e clássica narrativa contada por um ancião parodiando a existência e origem dos seres humanos. Particularmente, gosto desse tipo de introdução em histórias desse aspecto, pois causam uma imersão nos conceitos daquele universo e da própria cultura do qual ele é inspirado, além de abrir espaço para reflexões.

Além desse aspecto mais simbólico, o roteiro trabalha muito bem com o desenvolvimento de seus personagens se embasando na lei da causa e efeito, ou seja, a ação dos personagens sempre são carregadas com o peso de uma consequência, o que torna toda a jornada, mesmo que fantasiosa, um tanto mais realística e tensa, principalmente em sua segunda parte.

Deve-se notar também o tom trágico de toda a obra, que é uma característica bem presente em contos orientais, basicamente compreendo isto como o infortúnio sendo algo necessário para se encontrar a verdadeira felicidade (ou não encontrá-la, já que nossos desejos também pode nos levar a ruína).

Ou a sacrifícios dolorosos T.T Qiu T.T

Atrelado a isto tudo, temos uma animação repleta de cores fortes, com a presença constante de tons mais quentes, principalmente o vermelho, que é uma cor bastante presente na própria arquitetura oriental .

Deve-se compreender que o vermelho na China está atrelado a virtude, lealdade, vitalidade e felicidade, além de ser a cor correspondente do Verão, por causa disso que está bastante presente em templos (não apenas por causa do comunismo, ok?)e o Kun (a baleia voadora) vai tomando esta coloração no decorrer de seu desenvolvimento na história.

Junto a esta paleta de cores, a animação é uma mescla bem acabada de CG com 2D e apesar de ser bem visível as partes em 3D, a composição geral acaba sendo harmonizada e não incomoda, mas deslumbra o espectador em um fantástico mundo sobrenatural em que o absurdo e surreal é extremamente permitido.

E talvez o objetivo dos diretores tenha sido este mesmo, uma composição de imagens e cenas complexas com o intuito do espectador degustar e imergir na aventura pelo próprio visual.

Contudo esta atenção dada a jornada sobrenatural dos protagonistas e ao deslumbramento visual tenha contribuído para a história ter alguns furos que ignoramos no decorrer da narrativa por não serem tão prejudiciais ao enredo, mas apenas detalhes que podem até passar despercebidos.

[showhide type=”exemplo” more_text=”Mostrar” less_text=”Esconder”] Como o fato do Kun ter uma irmã mais nova que é praticamente esquecida no decorrer do conto (tá certo né diretor? uma criança se cuida sozinha XD) e o tempo entre a terra e o outro mundo não ser bem claro ( me explica como e por quanto tempo o corpo do Kun passou emergido sem se decompor, por acaso ele ganhou um corpo novo?) [/showhide]

 

Do mais, o que não me fez realmente dar cinco estrelas para esta produção é a relação do próprio Kum com a protagonista. Compreendam que a história dos dois é bonitinha, mas apenas isto, já que pelo filme ser um pouco corrido, você não vê um desenvolvimento maior no relacionamento dos dois, mas só fica subentendido que a protagonista acabou se afeiçoando extremamente a ele enquanto cuidava dele.

Mas vou admitir que esta cena me tirou umas lagriminhas

Portanto, toda a carga dramática que acaba envolvendo o espectador com os dois fica nas situações tensas que eles vivenciam do que na própria interação dos personagens, já que a maior interação que temos é a do Qiu com ela, o que é interessante.

Além disso, a carga extremamente melancólica encima do Kum acaba dificultando uma criação de um laço mais marcante com o personagem. Serve para criar empatia, mas nada mais do que isto já que o personagem em si não tem carisma (Porra Sirlene ele é uma baleia, um “mascote”, tá e a Banguela de como treinar o seu dragão é o que? o próprio free willy, lembra?)

Mas o que deve ser levado realmente em conta para quem deseja ver a produção e apreciá-la em sua totalidade é o fato do enredo apesar de delicado e aparentar ser extremamente simples é uma trama complexa que exige um pouco de conhecimento sobre a própria cultura oriental. Recomendo fortemente para os amantes de animação e principalmente para quem gosta de obras como as de Miyazaki.

Nota

Animação – 9/10

Direção – 9/10

Roteiro – 8/10

Trilha Sonora – 10/10

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Trailer do Filme

Sirlene Moraes

Apenas uma amante da cultura japonesa e apreciadora de uma boa xícara de café e livros.