As Crônicas de Arian – Capítulo 36 – A floresta de Ark

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Capítulo 36 – A floresta de Ark

— Vocês são mesmo classe B? — Perguntou Johan, olhando Arian e Lara. O garoto parecia bem pouco à vontade, observando a floresta a sua volta.

— Dissemos que era seu dia de sorte, Johan. Fora que esses são apenas amaldiçoados de baixo nível… Desde que tenha cuidado, mesmo classes D iniciantes dão conta — falou Arian.

Ele e Lara estavam matando os amaldiçoados que vinham em sua direção com facilidade, de cima de seus cavalos. Vindo de um em um, eles não eram ameaçadores, apenas corpos cheios de marcas negras que andam lentamente e mordem. O problema eram os amaldiçoados de alto nível, mas, felizmente, não tinham encontrado nenhum ainda.

Era o final da tarde, e ainda dava para ter uma boa visibilidade da floresta. A luz do sol passava entre as árvores, que nessa área, já tinham de 30 a 40 metros de altura, e só iam aumentando, conforme adentravam mais fundo na floresta. O chão era uma mistura de terra, grama baixa e folhas secas. Comparado a florestas densas e cheias de vegetação para todo lado que Arian já tinha visto, essa era bem mais aberta e fácil de se locomover. Se guiar era simples também. Se você quisesse sair, era só seguir na direção que as árvores iam reduzindo de tamanho. 

— Não tem nada mais difícil de matar por aqui? — perguntou Lara, enquanto cravava sua espada na cabeça de mais um amaldiçoado, que avançou contra ela. A criatura gritava, enquanto a espada de prata parecia queimar sua pele com o mero toque. Lara então, retirou sua espada e cortou-lhe a cabeça.

Vendo Lara usando aquela espada, Arian lembrou das instruções que recebeu antes de entrar pela primeira vez naquela floresta: “Sempre andem com uma espada de prata quando forem para a floresta. Cortar amaldiçoados, vampiros, licans e algumas raças de demônios que vivem lá, é muito mais fácil se usar uma. Além disso, o contato com a prata retarda a regeneração acelerada deles. Deixem a espada normal para humanos e criaturas comuns… Já ia esquecendo… Goblins! Cuidado com os malditos goblins! Eles são mais do que parecem…”.

Arian seguia à risca essa regra. Tinha duas espadas nas costas, por baixo da capa possuía uma normal e uma de prata, cruzadas. Fora a de emergência, sempre na sua cintura.

— De onde você acha que eles estão vindo? — perguntou Lara, começando a ficar entediada.

— Não sei, mas a origem de grupos pequenos de amaldiçoados vindos da floresta costuma ser um grupo de mercenários mortos no meio dela.

— Precisavam mesmo criar uma missão para isso? Nós poderíamos ter usado a guarda da cidade para continuar esperando eles saírem da floresta e os matar com espadas de prata — sugeriu Johan.

— Não é uma boa ideia, quanto mais tempo deixar eles soltos aqui, mais criaturas vão contaminar. Mas o motivo de criarem missões são os amaldiçoados de alto nível e… Parem! Não se mexam!

Um rato preto enorme, com parte das costas em carne viva, e olhos verdes brilhantes, estava vindo lentamente na direção deles. Arian mirou sua espada na criatura, se preparando para arremessá-la, mas antes que o fizesse, Lara desmontou do cavalo e correu até o animal.

— Parem de frescura, é só um rato.

— Lara, não!

O rato pulou em sua direção, mas foi cortado pela sacerdotisa antes que chegasse a seu corpo. O que ela não viu, foram os outros dois que vieram de trás. Arian arremessou sua espada e acertou um, mas o outro pulou e mordeu o braço de Lara.

— Que nojo! — Ela cravou a espada no rato, que continuava a morder seu braço, até morrer pouco depois, soltando um gemido bem sonoro.

Lara gritou de dor, conforme uma mancha negra, saindo da ferida que o rato fez nela, começou gradualmente a se espalhar por seu braço.

— Temos que voltar, agora! Você não tem muito tempo… — disse Johan, apavorado.

— Calado! Com quem acha que está falando?

Lara parou de gritar e se concentrou. A cor de seus olhos mudou de azul para dourado, e a pequena ferida em seu braço se curou rapidamente. Depois a mancha negra, que estava se espalhando, regrediu, até desaparecer.

— Uma sacerdotisa? Pensei que só grupos de alto nível tinham uma… — O garoto parecia aliviado e admirado ao mesmo tempo.

— Quem disse que não somos um grupo de alto nível? — disse Lara, tentando forçar um sorriso, enquanto se recuperava do susto. Johan parecia estar ficando cada vez mais confuso com aqueles dois.

— Ratos amaldiçoados são piores que humanos, são ruins de acertar, e ver. E está aí o motivo de pedirem o extermínio rápido de grupos de amaldiçoados, eles gradualmente vão infectando tudo que mordem na floresta. Chega a um ponto em que nenhum aventureiro de baixo nível se arriscaria a aceitar missões perto da cidade, e teriam que pagar um grupo de extermínio muito caro para resolver. Se absorvem muita energia na dimensão negra, quando são transformados, podem virar demônios de alto nível também.

— Já veio muito aqui? — perguntou Johan.

— Todo iniciante em guilds de Amira e Arcadia recebe missões relacionadas a floresta de Ark. Quase morri aqui, várias vezes…

— Por amaldiçoados?

— Não, goblins, quase sempre os malditos goblins. Licans inteligentes são horríveis também se um iniciante pega um deles sozinho, é quase certo que vai morrer. E Johan, fique olhando para trás, os goblins quase sempre atacam pelas costas. Se virem você de olho, vão ignorar nosso grupo.

O garoto obedeceu na hora, de forma meio exagerada até, virando a cabeça de um lado para o outro e depois para trás, repetidamente.

Eles continuaram por mais algum tempo, até que o sol sumiu.

— Não é melhor voltarmos? Já vai anoitecer…

— Você está suando frio desde que entramos. Qual seu problema com a floresta? Morou do lado dela a vida toda — questionou Arian, incomodado com a covardia do rapaz.

— Minha mãe sempre me contava história horríveis deste lugar. Prometi a ela várias vezes, quando era mais novo, que nunca entraria aqui… Quem diria que eu acabaria fazendo exatamente o contrário… — Johan deu uma risada, tentando disfarçar, mas seus olhos ficaram levemente avermelhados, como se estivesse quase chorando. — Ela insistia tanto para eu não entrar aqui, e acabou morrendo exatamente por isso…

— Em uma missão?

— Não, ela trabalhava na cidade. Não sei o que aconteceu. Um dia acordei e ela só não estava lá. Pedi ajuda à guarda, e no dia seguinte me disseram que encontraram o corpo dela não muito fundo na floresta. Tiveram que queimar por causa da maldição, então nem puderam trazer de volta. Tudo que restou foi esse pedaço do vestido que me deram — o garoto mostrou o pedaço de roupa que ele tinha amarrado como uma atadura no pulso.

— Lamento por sua mãe, Johan, mas vai ter que superar seu medo um dia.

— Estou tentando, entrei para guarda logo depois que ela morreu. Já faz um ano desde então… Mas não pensei que entraria aqui tão cedo, e sem treinamento…

“Olha só, está se saindo melhor que você. Dois anos se passaram e continua ajudando meio-elfas, em vez de encarar seu problema…”.

“Você não devia me ajudar em vez de me atormentar?”.

“Sou um produto da sua mente doente, segundo o que a curandeira da guild disse uma vez, então a culpa é sua. Você é um masoquista que criou uma segunda personalidade para pegar no seu pé…”.

Arian fez uma cara emburrada, discutir com Aran era inútil, porque, em tese, só estava discutindo consigo mesmo.

— Chega dessa conversa depressiva! Se quer treinamento só nos observe.

Lara parecia ter se recuperado, e avançava um pouco na frente deles, matando tudo que via com a espada de prata que Arian lhe deu.

— Vou aprender mesmo algo observando ela? É muito bonita, mas…

— Ignore ela. Correr por aí atacando tudo que passa pela sua frente, como ela está fazendo, é mais uma receita para morrer cedo do que outra coisa, principalmente nessa floresta.

— Ao menos ela parece estar se divertindo…

— Meu pai nunca me deixou fazer isso. Me tratava como um pedaço de vidro que poderia quebrar por qualquer coisa. — Lara estava ziguezagueando entre as árvores a galope. Parecia uma criança com energia em excesso, ou empolgada com um brinquedo novo.

— Queria ser uma aventureira? — perguntou Arian.

— Não, viver disso parece cansativo. Minha irmã que queria, mas era covarde demais para tentar. No entanto, com a companhia certa, é um passatempo divertido — disse ela, sorrindo para Arian.

— Vocês são casados? — perguntou Johan.

— Não.

— Sim.

O garoto olhou para eles confuso.

— Mantém o nosso disfarce… — sussurrou Lara, ao se aproximar do cavalo de Arian.

— Queremos nos casar, por enquanto somos só noivos. Ai!

<E>, que estava nas costas de seu cavalo, bateu na cabeça dele.

— O que foi? — questionou Johan.

— Um galho me acertou…

— Eu não vi nada caindo — O garoto olhou para o chão, e depois para cima, buscando o tal galho em meio as diversas árvores gigantes a volta deles.

Lara estava rindo sozinha. 

“Ela sabe da <E>, não sabe? Não pode ser coincidência…”.

De repente, várias criaturas saíram de trás de uma árvore, a uns 30 metros deles. Os olhos verdes brilhantes chamavam bastante atenção a distância, não havia dúvida do que eram.

— Outro grupo, são quatro, vamos pegar um por… 

Lara não esperou Arian completar a frase. Em vez disso correu na direção dos quatro amaldiçoados. Quando se viraram para ela, a garota colocou a mão para frente. Um brilho dourado saiu da palma de sua mão, e acertou os quatro amaldiçoados ao mesmo tempo. Eles voaram para trás, e começaram a agonizar, até seus corpos evaporarem completamente.

— O que você fez? — perguntou Johan.

— Lancei energia da dimensão celestial para dentro deles — disse ela, observando os corpos — Mas eu acho que não vai funcionar com lobisomens.

Um homem meio lobo de 2 metros de altura estava olhando para ela, em posição ofensiva, a uns 15 metros.

— Lara, não deixe ele encostar em você! Um lican pode arrancar seu braço com facilidade.

Arian desceu do cavalo e foi correndo até ela.

— Não queremos problemas. Estamos só eliminando os corpos — Arian se posicionou na frente de Lara e ficou encarando o homem lobo, com as mãos para frente, tentando mostrar que não queria feri-lo — Vai embora, anda…

— Não acho que está funcionando — disse Lara sorrindo, enquanto posicionava sua espada de prata ao mesmo tempo que um brilho dourado saía da mão esquerda. — Esse é o tipo mais comum, não? Queria ver um lican meio-tigre ou meio-urso, dizem que são muito mais fortes.

O homem lobo respondeu a provocação da sacerdotisa. Rosnou para eles e abaixou lentamente o corpo, pronto para avançar sobre as vítimas.

— Pare de provocá-lo! Acredite, não vai querer…

Arian foi interrompido pelo som de um trovão. Assim que escutou o barulho, o lican desistiu de atacá-los e correu para dentro da floresta.

— Ele tem medo de trovão? Que animal medroso.

— Não era um trovão… Foi um Portal! — Arian estava olhando de um lado para o outro, procurando a direção do portal que se abriu. Não estava afetando eles fisicamente, então devia estar a uma boa distância.

Em poucos instantes, o céu ficou completamente nublado, e começou a ventar.

— O portal está alterando o clima. Temos que voltar. — disse Johan, virando o cavalo.

— Sim, continuamos amanhã. — confirmou Arian.

— Agora que ficou divertido? — Lara agitou a cabeça em desaprovação.

— Por que quer tanto morrer? Suba logo nesse cavalo, não vai poder me contar nada que eu quero se estiver morta.

— Como quiser, amor — disse ela, mostrando a língua para ele.

Arian riu. Não queria admitir, mas estava se divertindo com a brincadeira de noivos.

— Ai! Se controla, <E> — A fantasma não parecia estar se divertindo como ele. No momento estava agarrada em seu pescoço e puxando seu cabelo.

Um estrondo muito alto soou por toda a floresta, agora realmente vindo de um trovão. Logo depois começou a chover. Arian e Lara montaram em seus cavalos e se viraram na direção do vilarejo de onde vieram. Começaram a galopar, mas passado pouco tempo se depararam com algo estranho, e pararam. Tinha uma fumaça negra, cobrindo todo caminho a frente deles.

— Que droga é essa? — perguntou Lara, tentando controlar seu cavalo, que parecia bastante nervoso. O de Johan também estava se recusando a obedecê-lo, e recuando na direção contrária à sombra. Apenas o de Arian parecia mais calmo.

— Se acalmem, ou vão cair desses cavalos. Eles sentem o seu emocional, se ficarem nervosos eles…

Antes que Arian pudesse terminar o que dizia, algo gritou de dentro da fumaça, e a névoa começou a avançar sobre eles.

— Corram! Rápido!

Todos se viraram na direção oposta e correram com seus cavalos para dentro da floresta, seguindo Arian.

— Sabe o que é aquilo? — perguntou Lara, olhando para trás a todo momento.

— Não!

— Então porque estamos correndo.

— Se vir algo que não conhece, corra! É a regra número um de expedições por aqui.

— Que covardia!

— Como quer lutar contra algo que não sabe o que é?

— Estamos avançando para o centro da floresta de Ark, à noite. Como isso parece uma ideia melhor do que enfrentar aquilo? — perguntou Johan, apavorado.

— É só fumaça! — disse Lara, virando a cabeça para olhar de novo.

Quando ela ameaçou frear para fazer algo, Arian agarrou as rédeas do cavalo dela e puxou, enquanto mantinha o controle do seu.

— Está louca?

— É energia da dimensão negra, eu posso purificar!

— Não é só energia, tem algo no centro soltando aquela fumaça! Dependendo do que for vamos morrer sem nem ter tempo de reagir.

Arian estava com dificuldade de guiar o cavalo por entre as árvores, enquanto puxava o de Lara, e ficava de olho para ver se ela não tinha decidido pular.

“Qual é o problema dela? É como se não desse a mínima por morrer aqui…”.

— Ao menos chute o que pode ser então! — gritou Lara, irritada.

— Um amaldiçoado level alto, talvez…

— Qual?

— Como eu vou saber? Eles revivem naquela forma porque recebem energia de portais negros que se abrem quando morrem. Alguns recebem tanta energia que se tornam demônios de raças variadas, ao invés de só começarem a se mexer e matar tudo que veem.

— P-pode ter vindo do portal que acabou de se abrir t-também… — disse Johan, tentando manter seu cavalo junto ao de Arian, e com uma cara de quem iria desmaiar de pavor a qualquer momento.

— Pode… — confirmou o guardião, que não tinha pensado nisso.

— Só temos que descobrir a raça então — Lara estava tentando puxar as rédeas do cavalo dela da mão de Arian.

— Tem mais de 5 mil raças de demônios documentadas naqueles livros de criaturas, e elas continuam se misturando para formar novas. Acha mesmo que eu decorei tudo aquilo e…

Outro grito vindo do meio da fumaça.

— Meus ouvidos! — gritou a sacerdotisa, cada vez mais nervosa.

— Está chegando mais perto! — Johan estava apavorado, batendo com as pernas na barriga de seu cavalo com força, na tentativa de fazê-lo correr mais rápido.

— Pare com isso, Johan! Ele está mais assustado que você com essa coisa. Está dando tudo que pode, bater nele não vai ajudar.

A fumaça continuava se aproximando cada vez mais.

— Lara, arremessa aquela energia que lançou antes na fumaça! 

Lara virou uma das mãos e lançou um feixe dourado de luz na direção da fumaça. Um grito agudo soou por toda a floresta, enquanto parte da fumaça se dissipou.

— Funcionou! Acho que posso…

O grito aumentou e a fumaça começou a se expandir, de novo, indo ainda mais depressa na direção deles. Lara se preparou para lançar energia de novo.

— Esqueça isso! Só a deixou mais irritada.

— Podemos com ela, só tenho que aumentar a carga!

— Por que acha que não tem mais nada vindo na nossa direção, mesmo com esse barulho todo? Estão com medo dessa coisa! Seja lá o que isso for, nem os amaldiçoados normais, ou qualquer criatura nessa área da floresta, querem chegar perto. Escute o instinto deles ao invés dos seus desejos suicidas, maldição!

— Eu realmente gostava mais de você no passado…

Depois disso, Lara resolveu ficar calada. Pouco tempo depois, a chuva aumentou, e a noite tinha caído.

— Não estou vendo nada!

— Só me segue Johan! Ignora tudo e só presta atenção no meu cavalo.

— Consegue ver algo nessa escuridão?

— Eu vejo tudo!

Uma vantagem da qual nunca reclamou, Arian podia ver tão bem à noite quanto de dia, embora tudo ficasse menos colorido. Sua audição era superior a de um humano também, embora não tão boa quanto a de um animal.

— Cuidado com os galhos! Tem algumas árvores mais baixas por aqui.

— Ai! Mas que droga! — Lara havia batido em um dos galhos.

Uma luz forte veio do lado dele. Arian se assustou, até notar que era Lara, produzindo luz de sua espada. Tinha esquecido disso, era uma magia das mais simples para pessoas com ligação ao plano celestial.

— Acha que ele desistiu? — perguntou Johan.

Arian se virou para ver. A fumaça continuava atrás deles, apesar de estar mais distante agora. Mas não lembrava de nenhuma criatura que já tivesse enfrentado que produzisse aquela fumaça.

— Não! Ainda está nos seguindo.

— Meu cavalo não vai aguentar muito mais…

— Se ele começar a diminuir o ritmo, pule nas costas do meu!

Cavalgaram por mais algum tempo, até que o cavalo de Johan se recusou a continuar. A criatura finalmente sumiu também.

— Parem! — gritou Arian, enquanto tentava se localizar.

— Onde estamos? — perguntou o garoto.

— Não sei, mas entramos muito na floresta. Vamos ter que dormir aqui.

— Está louco? — Johan olhava de um lado para o outro, tremendo sem parar, por medo, ou frio, considerando que estava encharcado da chuva.

— Quer voltar e arriscar dar de cara com aquilo de novo? Fora que só eu posso ver a noite, vocês são presas fáceis aqui. E Lara vai chamar tudo que se move para cima de nós com essa luz que está produzindo. Reduz isso…

— Certo, como vamos dormir aqui então? — perguntou ela.

— Árvores. Com ratos amaldiçoados perambulando vamos ter que dormir em cima de uma delas. É mais seguro.

Arian apontou para uma árvore enorme, com mais de 100 metros de altura. Lara iluminou naquela direção. 

— Deixem os cavalos presos no pé da árvore, vão fazer barulho se virem algo. A raça dos White Astalon podem ver no escuro e escutar muito melhor que nós.

Arian prendeu seu cavalo no galho de uma árvore ao lado da que eles iriam dormir.

— Me acorde se algo acontecer, garoto — disse ele, olhando para seu cavalo.

— Acha que ele te entende? — perguntou Johan, tremendo de frio. Todos estavam encharcados da chuva. Já Arian se encontrava em melhor situação. O manto dele era a prova d’água, e não tinha problema com um frio leve daqueles.

— Esses cavalos são mais inteligentes que o normal. Não acho que me entendem perfeitamente, mas com certeza vão fazer muito barulho se virem algo se aproximando.

Arian levou Lara, e depois Johan, para cima da árvore, no galho mais grosso que encontrou. Estavam a uns 20 metros do chão. Lara parecia estranhamente trêmula.

— Você tem medo de altura? — perguntou Johan.

— Não… Só não gosto de lugares altos.

“Não é a mesma coisa?”.

Cada um se ajeitou como podia ali, usando as cordas que trouxeram nos cavalos para se prenderem na árvore. Arian já estava acostumado àquilo, então apenas encostou as costas no tronco central e tentou relaxar. O galho que cada um deles ficou era bem largo, então conseguiam manter todo o corpo em cima do mesmo sem dificuldade.

Depois de algum tempo, Arian acordou com Lara se espremendo junto a ele, dando a desculpa de que não conseguiria dormir ali em cima, sem alguém segurando-a. Se ela tinha mesmo medo de altura, fazia sentido.

— Não está com frio?

— Tenho resistência ao frio, meu problema é com calor.

— Sorte a sua…

— Seria uma boa hora para dizer o que eu sou…

— Não foi o combinado. E eu já disse, eu não sei. Mas se quer uma dica…

Lara juntou mais ainda seu corpo ao dele, para o desespero do homem, que estava tentando controlar seus instintos. Dava para ver através da camisa branca encharcada de Lara. Ela aproximou seu rosto do dele e falou baixinho em seu ouvido.

— Meu pai disse que sua mãe era um membro importante do nosso país no passado, antes de se mudar.

— E o seu país seria?

— Meu nome é Lara Moonsong.

— Moonsong? O país dos vampiros? Então eu sou…

— Acho que não, sua mãe não tinha as características de um. Mas meu pai nunca quis dizer exatamente o que ela era, ou o que era o seu pai.

— Meu pai?

— Acho que já disse o bastante.

Lara apoiou a cabeça no ombro dele e fechou os olhos.

— Espera, então você é da família real?

— Princesa Lara, terceira filha de Alexander Moonsong — disse ela, sem abrir os olhos.

— Mas se você é uma vampira…

— Eu não sou uma…

— Como isso é possível?

— É uma longa história… e eu estou cansada…

Lara dormiu logo depois, apoiada no corpo de Arian.

A chuva parou pouco tempo depois. <E>, estranhamente, parecia estar com pena de Lara, ao invés de nervosa por estar se agarrando em Arian. Estava fazendo carinho na cabeça dela, que estava tremendo, seja por medo da altura, ou por estar com frio.

Ao ver Lara tremendo, Arian pensou um tempo, e então resolveu abraçá-la. Mesmo com a roupa molhada, seus corpos juntos deveriam gerar mais calor. Seu coração estava acelerado, e com certeza Lara devia poder sentir o que estava acontecendo no meio das pernas dele. Mas decidiu tentar ignorar isso.

“Genial! Agora sim que não vamos conseguir dormir…”

Graças àquela criatura na fumaça espantando tudo a uma boa distância deles, não tiveram problemas com nada os atacando durante a noite. Quando amanheceu, o Sol os acordou. Tirando Arian, que mal conseguiu dormir com o corpo molhado de Lara se espremendo contra o dele. Só precisava de metade do tempo de sono de um humano normal, mas não tinha conseguido nem perto disso. Lara, por outro lado, parecia bastante revigorada. <E> estava de extremo mau humor. Podia não ter se importado de Lara usar Arian de aquecedor humano, mas ficou uma fera quando ele a abraçou, e com a reação natural dele a um corpo feminino encharcado, encostando nele a noite toda.

Arian olhou o mapa da floresta, que tinha com ele, e conseguiu se localizar.

— Vamos naquela direção.

— Ainda quer continuar? — perguntou Johan, descontente.

— Não faz sentido voltar agora. Devemos estar bem perto da fonte. Os amaldiçoados estavam vindo dessa direção, só temos que continuar seguindo para lá — apontou ele no mapa.

Subiram nos cavalos e avançaram. Algum tempo depois, encontraram a fonte dos amaldiçoados.

— Por Alizen! — disse o Johan, assustado.

— Fale baixo, eles têm uma audição melhor que a nossa.

A uns 100 metros deles, em uma área aberta, à beira da entrada de uma caverna, em uma rocha gigantesca, várias criaturas de aproximadamente 1 metro de altura andavam de um lado para o outro. Os corpos, humanoides, eram muito finos, e as cabeças lembravam a de ratos sem pelo, só que mais deformadas, e com orelhas mais longas. As cores variavam entre cinza e verde escuro.

— Goblins…? — questionou Lara.

Arian confirmou com a cabeça. Eles prenderam os cavalos em árvores e se aproximaram, até chegar a uns 20 metros de um deles. Ficaram escondidos em uma área com bastante vegetação.

“Parece um acampamento humano. Provavelmente era de mercenários, e foi tomado pelos goblins”.

Tinha uma jaula grande de madeira cheia de amaldiçoados dentro, provavelmente os homens do acampamento mortos pelos goblins. Alguns ainda pareciam conscientes. Arian estava pensando no que fazer, quando um grupo de 13 mulheres em fila apareceu. Variando de aproximadamente 15 a 30 anos, cheias de machucados pelo corpo, estavam sendo escoltadas por vários goblins, que apontavam facas para elas, enquanto diziam alguma coisa. As mãos de todas estavam amarradas por cordas, e as roupas quase todas rasgadas, mal cobriam os seios.

— Maldito covarde! — falou Arian, dando um soco no chão.

— O que houve…? Espera, é a mesma coisa daquela casa… É o outro Arian, que o Marko falou? — questionou Lara.

— Sim… Aquele linguarudo te contou disso durante a viagem também?

— Contou. Mas por que trocaram?

— Uma meio-elfa daquele grupo parece com alguém que ele conhecia. O covarde não aguentou ver a situação deplorável dela, e me colocou para assumir, com a desculpa de que não conseguiria agir com calma olhando para ela…

Arian parecia levemente irritado, e menos expressivo.

— Que droga, estou morto de sono. Ele ficou excitado com seu corpo a noite inteira, graças a isso, mal conseguimos dormir.

— Bom saber… Mas então… por que não fez nada? — Lara estava com um sorriso perverso de todo tamanho na cara.

— Esse covarde? Nunca ia conseguir. Uma certa pessoa que ele conhece iria começar a chorar e ele daria para trás.

Lara riu e voltou a observar o acampamento dos goblins.

— O que eles estão fazendo com aquelas mulheres?

— Provavelmente levaram elas para tomar banho. Chega um momento que nem eles aguentam o cheiro.

— Eles as mantêm para trocar por dinheiro?

— Não, para procriar…

Lara olhou para ele assustada com a resposta.

— A maioria dos goblins nascem machos. Como acha que eles procriam tão rápido? Conseguem reproduzir com quase qualquer humanoide. E tirando casos raros, quase sempre nascem goblins puros, não importa a mãe.

— Eu preferiria morrer…

— Elas também… mas não dá. Eles cortam a língua das mulheres capturadas e costuram, para evitar que se matem mordendo a língua. E sempre deixam um, ou mais guardas, as vigiando. A maioria daquelas mulheres nem consegue pensar mais depois do que passaram, são só corpos que andam e procriam para eles. Foi isso que deixou meu outro eu abalado. Mesmo que ele salve a meio-elfa que está ali, ela dificilmente vai se recuperar. E ao que parece ela está grávida…

Lara não falou mais nada, só olhou com raiva na direção do acampamento.

— Vamos acabar com eles — disse ela, tirando sua lâmina espiritual da cintura.

— Pensei que não se importava com ninguém… Parece que Joanne se enganou…

— Não me importo com aquelas mulheres. Mas estou com raiva o bastante desses vermes para querer arrancar a cabeça de cada um deles.

— Precisamos de um plano, quando…

Arian parou de falar ao notar que Johan estava olhando para o acampamento sem mover um músculo, já fazia algum tempo.

— Johan, o que foi? — Arian o balançou.

— É… É a minha mãe… — disse ele, apontando para a última, das 13 mulheres em fila, sendo levadas para dentro da caverna.

Arian olhou para ele com pena. Cabelos negros caindo até o ombro, o corpo todo machucado, e um rosto bonito, mas completamente sem vida. Devia ser prisioneira deles há muito tempo. Apenas um resquício do que já foi a mãe dele um dia.

Próximo: Capítulo 37 – Goblins

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