As Crônicas de Arian – Capítulo 17 – Inesperado

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Capítulo 17 – Inesperado

Dorian estava ficando entediado com aquele torneio, então, por diversão, e na esperança de conseguir um desafio maior, resolveu tentar deixar Arian bravo. A provocação com a elfa foi mais efetiva do que ele pensou.

O garoto até mesmo descobriu uma forma de parar sua magia de choque, algo que demorou anos para desenvolver. 

“Finalmente”, pensou Dorian. Já estava começando a achar que as preparações caso o choque desse errado tivessem sido perda de tempo.

Partiu para as espadas elementais. As pessoas deviam pensar que eram espadas mágicas, mas não tinha dinheiro para isso, eram apenas espadas com facilidade em absorver magia. Funcionaram a princípio, as espadas de Arian eram fracas e estavam sucumbindo pouco a pouco.

Felizmente, ninguém acreditaria que ele estava usando magia, já que poucos conseguiam usar por tanto tempo sem descer de 70% de energia. Foi bom ter levado o conselho de seu pai a sério. Gastou anos aprendendo a usar o mínimo de energia possível para executar magias, e isso lhe deu mais vantagens do que podia contar durante a vida.

Pressionado, Arian tentou chutá-lo, achando que o pegaria desprevenido. Sentiu até pena quando a perna dele queimou e congelou ao mesmo tempo ao encostar em suas espadas, aquilo devia doer.

“Fácil demais”. Por um breve momento achou que a luta estava ganha. Mas do nada, vislumbrou os olhos assassinos de Arian e deu um salto grande para trás, evitando o golpe completo de sua espada.

Que espada era aquela que ele tirou da cintura? Ele a movia rápido demais, era como se não tivesse peso algum. Sua aparência era medíocre, cheia de fissuras, mas o que conseguia fazer era absurdo. Por que ele esperou até ali para usá-la? Por que não antes?

Dorian bloqueou dois golpes com suas espadas, mas o terceiro o pegou de raspão no ombro, e depois na perna. Suas espadas elementais não tinham efeito contra essa, devia ser uma espada mágica de alto nível, ou os meio-elfos de Distany a fizeram para ele também?

Sem opções, se distanciou de Arian e tentou ganhar tempo com um discurso, enquanto recuperava o fôlego:

— Como eu disse, garoto, preparação é tudo! Sua vantagem física, sua experiência em combate, até mesmo essa espada estranha, nada disso vai te dar a vitória. Você se preparou para uma possibilidade do que o seu adversário iria fazer, eu me preparei para mais de 10!

Blefou sobre ter muitas outras estratégias guardadas, mas tinha que continuar parecendo confiante para manter o adversário apreensivo. A realidade era que essa seria sua última cartada, não tinha mais opções. Lançou uma corrente de ar em direção ao chão com sua espada esquerda, levantando a areia do local, e nublando a visão do público do que iria acontecer ali. Era agora! Com a outra espada lançou um feixe de ar na direção de Arian, que voou para trás. Estava bambo. Parecia estar com dor no ferimento da luta contra Kadia.

Dorian ficou com um olhar sério pela primeira vez, chegou o momento que estava esperando desde que o torneio começou. O garoto não parecia quem ele procurava, mas tinha que ter certeza, era agora ou nunca. Lançou mais dois feixes de ar, e no terceiro Arian não conseguiu desviar e foi lançado contra a parede da Arena. Guardou as espadas e tirou uma lança de metal, pequena e fina, das costas. Ninguém dava nada por aquilo, mas custaram uma fortuna, eram feitas do mesmo material raro da armadura de Arian, o que significava que podia penetrá-la, e que eram muito leves.

Lançou duas em direção ao adversário, usando uma magia de ar para dar impulso e direcionar. A primeira Arian conseguiu desviar com a espada, mas a segunda penetrou seu ombro e o prendeu a parede.

Arian soltou um grito agudo de dor que ecoou por toda a Arena.

Se aproveitando do inimigo com a guarda aberta, Dorian repetiu o ataque, e conseguiu acertar o outro ombro.

Era o fim, só mais um arremesso… Respirou fundo e hesitou por um momento… mas não podia parar agora.

— Adeus!

Lançou mais um, mirando o meio do peito do adversário. Mas pouco antes da lança o acertar, a terra da Arena a volta de Arian voou para todo lado. Dorian não conseguia ver nada direito. Um barulho de algo explodindo veio da direção de Arian. Dorian podia reconhecer o barulho em qualquer lugar, um portal de conversão acabou de ser aberto. E para gerar aquele barulho todo…

— Que droga é essa?!

Círculos de conversão, variam do tamanho de uma mão, a 2 metros de raio.Quanto mais energia sendo drenada da dimensão, maior o círculo. Se quisesse canalizar uma quantidade muito grande de uma vez, teria que gerar múltiplos círculos.Fazer um gigante deixava quase impossível de controlar o fluxo, e gastava uma quantidade estúpida da energia espiritual da pessoa. O que Dorian viu ali, era algo completamente fora da escala. Tinha um círculo de conversão ocupando toda a área acima da Arena, com símbolos que ele nunca viu antes, de que dimensão aquilo estava drenando energia?

Enquanto tentava entender o que estava havendo ali, viu Arian, ou o que parecia ser ele. A fumaça levantada ainda encobria o local, mas dava para ver que Arian estava solto, e vindo em sua direção. A espada com um leve brilho azul, assim como nos ferimentos dos ombros e olhos. O brilho deixava bem clara sua posição, mesmo no meio da fumaça.

Não pensou duas vezes, lançou uma enorme bola de fogo em sua direção, que acertou em cheio, criando uma grande explosão, e levantando ainda mais fumaça do meio da Arena.

— Só pode ser brincadeira…

Arian saiu do meio da explosão ileso, e continuava vindo na direção de Dorian. O mago pegou mais duas lanças e arremessou na direção do adversário. Só tinha 10, elas estavam acabando. Arian quebrou as duas com a espada e continuava correndo em sua direção.

“Como essa coisa quebrou o metal mais resistente que existe? ”. Estava a poucos metros dele. Dorian fez uma barreira de ar e se preparou para bloquear o golpe do adversário com suas espadas. Quando Arian chegou, Dorian quase pulou para trás por impulso. Seus olhos estavam azulados, algo se mexia dentro deles, era como se tivesse energia fluindo dentro das pupilas. Ele atravessou a barreira de ar de Dorian como se não fosse nada.Seja qual fosse o elemento azulado que o estava envolvendo, bloqueava completamente o ar e o fogo. Sua espada estava com uma aura azul, e quando encostou nas espadas de Dorian, ambas foram estilhaçadas no mesmo instante, enquanto ele voou uma distância enorme para trás.

Dorian tentou ficar de pé rapidamente, mas um dos pulsos quebrou com o impacto de tentar segurar o golpe de Arian, e o maldito estava vindo para matá-lo. Teve que usar só uma mão para se levantar.

Não tinha mais tempo. Dorian refletiu por um segundo, com uma cara que expressava bem sua mistura de sentimentos de tristeza e ódio. Por um lado, morrer não parecia uma escolha tão ruim, mas não podia cumprir sua promessa se o fizesse. Só havia uma opção possível. Como seu pai lhe disse uma vez: “Não tenha medo de errar, repita até ficar melhor, e saiba admitir a derrota. A morte não te ensina nada. Mas se permanecer vivo, pode aprender com seus erros e saber como ganhar da próxima vez”.

Dorian respirou fundo, deu um sorriso, levantou os dois braços e gritou o mais alto que pôde.

— Eu me rendo!

A espada de Arian parou quase encostando em seu nariz. A velocidade da lâmina era tanta, que quando o adversário parou a espada, o vácuo limpou boa parte da fumaça da área, ou seria a energia em volta da lâmina se dissipando? Não teve certeza. Que magia louca era aquela? Nunca viu nada parecido.

O apresentador parecia não saber bem o que falar, nem o que tinha acontecido ali, mas improvisou:

— E-e Arian é o vencedor do torneio!

A plateia gritou loucamente. Com magia ou não, acabaram de ver algo mais épico do que esperavam de um combate que deveria ser puramente de armas.

Dorian sorriu, mesmo sabendo que seria desqualificado por uso de magia. Naquele ponto não tinha mais relevância, ele já tinha a informação que queria.

A luz nos olhos e espada de Arian sumiu, e ele caiu de joelhos no chão. Estava respirando com dificuldade. Seu pagamento também era ficar sem ar? Não, sua pedra ainda estava azul. Como ele criou aquele círculo absurdo sem gastar nem 30% da sua energia?

— Calma, <E>, ficar desesperada não vai ajudar. Eu vou ficar bem… — falou Arian, segurando um dos ombros feridos, de onde uma quantidade razoável de sangue estava saindo agora. Seja o que for, aquela energia azul estava bloqueando o sangue que saía dos ferimentos antes, mas assim que ela sumiu, esse efeito se perdeu. 

— Que dimensão era aquela que estava puxando energia?

— Dimensão?

— Você nem sabe o que estava fazendo?!

Arian deu uma risada, enquanto tentava se levantar. Parecia exausto.

— Ai, tudo doí… Parece que não pode prever tudo, afinal… Mas se souber explicar o que viu, eu agradeço. A única coisa que eu sei é que faltava pouco para eu perder a consciência, e quando acontece aquele estado, bem… digamos que não é bom para ninguém que esteja perto.

— Eu posso imaginar… — Dorian mudou de seu jeito descontraído para um olhar sério, por um breve instante.

Do alto da arquibancada, a elfa que seu adversário acabou de ganhar parecia estar chorando, provavelmente de felicidade.

— Atenção! Uma correção. Arian e Dorian foram desqualificados pelos juízes por suspeita de uso de magia.

Arian ficou pálido, e a elfa na arquibancada parecia tão perdida quanto ele. Depois de tudo que ocorreu ali era meio óbvio que seriam desqualificados, mesmo com areia encobrindo, dava para ver claramente que tinha magia envolvida no combate.

— Não é o seu dia guardião…

Dorian começou a rir, para a irritação de Arian, que já devia estar arrependido de ter poupado sua vida.

— Pobre elfa, imagina se acabar na mão de um degene… —  antes de terminar a frase, levou um soco de Arian no rosto com tanta força, que foi arremessado alguns metros para trás, antes de cair de costas no chão.

Tentou se levantar, mas estava tonto. Tudo foi ficando nublado, até que desmaiou.

— Finalmente acordou! Está dormindo desde ontem à tarde, já é de manhã Dorian.

Um homem de uns 30 anos, com corte de cabelo militar e barba bem feita, estava sentado em uma cadeira ao lado de sua cama. Dorian estava em seu quarto.

— Seu pagamento até que é brando, você fica sem conseguir respirar até desmaiar. Felizmente, você volta a respirar quando apaga. Até que é um bom pagamento.

— Como isso pode ser considerado bom? — disse o Dorian, se levantando emburrado da cama.

— Sabia que tem pagamentos em que a pessoa morre? Alguns perdem a função de membros do corpo para sempre, começam a sangrar por todos os orifícios, outros perdem memórias, ficam sem conseguir falar, a comida muda de gosto, ficam cegos, e mais tudo que conseguir imaginar. O seu não parece bom comparado a eles?

— É… Falando nisso, é verdade que bruxas não têm pagamentos?

— Hum, as bruxas das histórias que sua mãe conta são mulheres que nascem com dom para magia negra, mais precisamente, tem uma ligação forte com a dimensão escura. Elas drenam essa energia sem querer durante a vida, e isso vai as enlouquecendo com o tempo, até começarem a dar risadas exageradas e usar magia sem controle para destruir tudo à sua volta.

O garoto fez uma cara de desapontamento, o que fez o homem rir.

— Desculpe estragar o mito para você, ele sempre perde um pouco da graça quando alguém te explica isso. Mas, curiosamente, os pagamentos de quem têm afinidade com a dimensão negra não são muito ruins, é quase sempre a mesma coisa. Por isso alguns falam como se elas não tivessem pagamento. Bem, ficarem loucas devido a energia da dimensão escura já parece um pagamento o bastante, sorte a nossa que é raro homens nascerem com afinidade a essa dimensão.

— Como é o pagamento das bruxas?

— Quantos anos você tem? Oito? Quando for mais velho eu lhe conto. Agora levante e vamos voltar ao treino.

— Eu não vou desmaiar de novo?

— Só se exagerar. Agora que desmaiou deve ter noção do seu limite baseado no seu pagamento. Quando estiver começando a ficar sem ar, pare de usar magia por algum tempo. Você tem afinidade com mais de uma dimensão, o que é bem raro.Quando tentou drenar energia delas, puxou muitas ao mesmo tempo, e acabou com toda a energia do seu corpo no processo de conversão.

— Mas eu fiz como você disse, tentei puxar energia de uma dimensão que eu conseguisse sentir, em vez de usar a minha própria energia para queimar o graveto.

— Sim, mas não disse para puxar de mais de uma dimensão ao mesmo tempo, e em tanta quantidade. Não sabia que você tinha afinidade com mais de uma, então foi um erro meu também. Ao invés de puxar a que você sente com mais facilidade, no seu caso, que sente mais de uma, tem que haver uma escolha de qual puxar, o que é mais complicado. E você queimou aquela área inteira, não só o graveto. Nunca fui bom o bastante para aprender como se faz, mas existe uma forma de drenar a energia das dimensões gastando o mínimo possível da energia espiritual do seu corpo. Quando entrar na academia de magia, tente aprender sobre isso. Com o seu talento para usar magia de mais de uma dimensão, você pode ganhar muito dinheiro, caso aprenda a não esgotar sua energia rapidamente… moleque, mas o que… como está fazendo isso?!

Dorian estava apontando uma das mãos para frente, o que estava gerando uma leve brisa no quarto. A outra mão estava com uma leve chama a cobrindo.

— Não sei bem, mas acho que entendi a ideia… só preciso reduzir o que estou drenando baseado no tamanho desse círculo. Ele aumenta ou diminui de acordo com o quanto eu puxo, fica fácil controlar assim.

— Você consegue ver os círculos de conversão?!

Seu pai estava boquiaberto.

— Sim… Você não? Eles aparecem quando eu tento drenar energia das dimensões. Consigo ver os que aparecem quando você usa magia também… Pai, por que está fazendo essa cara?

— Sabe quando alguns músicos superdotados dizem que escutam as notas musicais como se estivessem vendo cores no ar, de tão fácil que é para eles identificar cada uma delas? O que você está vendo é muito parecido com isso. Filho, você ainda vai ser muito importante algum dia! — disse ele, esfregando a cabeça do garoto.

Dorian acordou na ala de feridos. Seu rosto doía muito, mas a lembrança de seu pai o alegrou. Levantou rapidamente, pegou suas coisas ao lado da cama e saiu pela porta. Só tinha uma coisa em sua mente no momento, “se ele e Arian perderam, quem ficou com a elfa e o prêmio?”.

Próximo: Capítulo 18 – O Vencedor

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