Kizumonogatari Parte 3 – Cicatrizes | Review

Paradoxo.

Por definição, uma ideia que vai contra os princípios básicos da lógica, ou pensamento humano. Um conceito ou teoria que carrega um ponto ilógico, ou sem nexo. Em outras palavras, uma verdade fraca demais para se sustentar, ou uma mentira boa o bastante para não ser negada.

Um paradoxo.

Assistir Kizumonogatari, em especial a parte III, não é nada mais do que apreciar um belo paradoxo se formar na minha mente. É como se uma pequena linha lógica fosse sendo escrita, pouco a pouco sendo preenchida por informações e ideias que soa cada vez mais certas, para no final, tudo parece desconexo, duvidoso e ilógico.

Sendo assim, por essa mera razão, parece natural imaginar que esse texto vai seguir o mesmo principio. Por mais que pareça coerente, e tente traçar uma linha lógica, no fundo, ele é desconexo, duvidoso e ilógico. Simples assim, sem qualquer poetização.

Vamos apenas conversar.

Reikketsu-hen, diferente das outras duas partes, é um daqueles casos raros onde uma adaptação consegue superar o original. Não que as outras duas partes tenham sido ruins, longe disso, elas foram boas e entregaram exatamente o que queríamos, porém, esse é o ponto. Elas não fizeram nada além do que precisavam, assim mesmo, ainda houveram pontos que não acertaram completamente.

No caso da terceira parte, as coisas são um pouco diferente, talvez por conta da história, que acaba se tornando mais densa e dramática, já que é o final. Mas independente disso, você sente que houve um propósito para aquele filme. Não era uma questão de ver tudo se movendo, ou terminar o que começaram há anos atrás com Bakemonogatari.

O filme te convence que existe por uma razão, por um motivo que, caso não estivesse ali, você não teria aquelas sensações. Mesmo que sua imaginação seja uma das melhores, ainda é impossível visualizar tudo em detalhes, criar cenas e interações não é fácil para mente humano, principalmente quando isso vem resumido em palavras.

Você não imagina as roupas de uma pessoa quando lê a palavra “gritar”, você imagina o desespero que ela carrega naquele momento. Você não imagina os lençóis da cama quando lê a palavra “chorar”, você imagina a tristeza que aquela pessoa carrega naquele momento. Você imagina sensações ao invés de imagem (por mais contraditório que seja)

Por isso, ao menos para mim, adaptações não são uma mera questão de colocar tudo ali se mexendo, e com uma boa qualidade. Ela precisa me mostrar aquilo que não consegui imaginar, assim como me fazer lembrar do que senti. E quando conseguem elevar isso, e me trazer novas sensações, aí sim posso dizer que foi uma boa adaptação.

Kizumonogatari Reikketsu-hen conseguiu me trazer esse exato sentimento, como se eu estivesse recebendo algo além do que precisava, e no final, eu só posso dizer que foi uma das experiências mais gratificantes que tive.

E essa coisa linda é o melhor de tudo.

O início do filme começa do jeito que precisava, respondendo e explicando tudo o que foi “escondido” durante as outras duas partes de forma rápida e direta.

O fato da Kiss-Shot ter perdido para três exorcistas, sendo que o Araragi, como um simples servo, ganhou deles sem qualquer problema, e os envolvimentos do Oshino na história, mostrando que ele não é só um tiozão estranho.

Depois disso, as coisas seguente para o relacionamento do Araragi com a Kiss-Shot, e entram em um clima tão cativante que eu podia ficar vendo aquela parte o tempo inteiro.

Deixaram tudo tão tranquilo e suave, tão relaxante e pacifico, como se realmente o inferno tivesse acabado, que não tem problema sorrir, que não tem problema ficar apenas olhando aquilo por um longo tempo, realmente apreciando a ascensão de uma vampira lendária.

Imagem meramente ilustrativa sobre essa parte.

Ela é uma das personagens que mais gosto, e ver aquelas cenas foi gratificante. Se repararem, é um dos poucos momentos em que abandonaram os exageros e simbolismo para focar por completo naquele instante, criando uma verdade relação “a dois” ali. Era somente o Araragi e ela conversando, mas era como se tivesse me sentado para ouvir os problemas da Kiss-Shot junto.

A música pode ser simples, mas vai construindo um drama tão bom, que vai se intensificando a medida em que as coisas vão sendo explicadas.  E assim como no final, quando ela começa se justificar, dizendo que acabou sentindo medo de morrer, e as imagens vão mostrando ela se encontrando com o primeiro servo, deixa tudo incrível.

Esse tipo de sensação era impossível de alcançar lendo a novel. Esse clima, as cenas dos dois rindo e se entendendo são uma experiência única que só é possível com o filme. A direção conseguiu superar as sensações que eu tinha como o texto, e criar uma situação de satisfação e paz tão grande, e tudo apenas para ver isso…

O início do meu paradoxo.

Foi exatamente nessa cena, ou melhor, no resultado lógico dela, que coloquei o Nisio no topo da minha lista de autores preferidos. Eu estava lendo tudo tranquilamente, querendo ver como o Araragi iria recuperar os membros roubados, até que o primeiro click  aconteceu, e eu parei para pensar no que diabos estava lendo.

A cena no filme consegue fazer isso ficar ainda mais aguçado porque carrega todo aqueles pontos  que citei acima. Tudo parece feliz, até mesmo as narrações do Araragi voltam (propositais, ou não), e você sente aquele clima Monogatari de sempre. Eles montaram um flashback usando as três fases da Kiss-Shot, começando pela criancinha em meio as flores, e indo até a adulta, tudo para afastar o máximo a noção de vampiro.

E quando o Araragi entre pela porta com um “tadaima” todo feliz, e se depara com aquela cena, não tem como ficar arrepiado. A brutalidade daquilo foi incrível.

Ok, o CG deu um contraste meio estranho, mas ver aquilo sem censura, com a Kiss-Shot comendo parte por parte, se sujando de sangue e realmente se comportando como um monstro, foi surpreendente porque eu não tinha visualizado daquela maneira, com aquela intensidade.

E como disse, o efeito lógico que isso traz, é algo que só a mente doentia do Nisio consegue pensar.

Vampiro sentem fome.

Eu li 200 e poucas páginas, torci para ver ela recuperando os seus membro, como se aquilo fosse bom, mas no final, assim como o Araragi, a sensação que tinha era a de ter “salvado” um monstro enquanto deixava a humanidade a Deus dará, tudo porque parecia o lógico a se fazer.

Enquanto lia/assistia, eu pensava nas mesmas coisas que ele. “Como eu não percebi antes”, “vampiros devoram pessoas, esse é o senso comum”, “eu queria que o monstro da história fosse salvo?” , esse tipo de pensamento foi sendo construído pouco a pouco.

Você começa vendo um adolescente insano, doando sua vida para um monstro, e quando menos percebe, está simpatizando com o mesmo monstro e torcendo para ele ficar bem. Talvez soe sem sentido, e eu até entendo que isso tem muita cara de fã maluco, mas era o que a história pedia, e o filme consegue aprimorar essa sensação por conta do impacto visual que cria.

Essa sensação de “Yey, missão cumprida”, e todo aquele sentimento de que o “certo” foi alcançado, foi tão bem aproveitada, que quando chega no ápice, você realmente sente  a perda que teve, e todo o peso psicológico que é criado em cima do Araragi, te faz pensar sobre o que estava acontecendo ali. Até mesmo nas cenas um tanto quanto questionáveis.

Algo para se pensar antes de ligar o filme na tv da sala.

Ok, era impossível fazer uma review e não falar desse bem dito fanservice. Minha opinião? Foi exagerado. Principalmente por que na minha mente aquilo tinha sido mais cômico do que sexual. Poderiam ter pegado um pouco mais leve no final, onde as brincadeira começam a aumentar de intensidade, ou então terem feito um pouco menos agressivo.

Porém, por mais que o fanservice nos oppais da Hanekawa possam ser o maior destaque ali, a cena ainda é bem importante, por conta do comportamento dela em relação ao Araragi. É naquele momento que ele é salvo por ela, e então a divida de “sempre estar por perto quando ela precisar”,  é criada.

As coisas acontecem até de forma mais sutil que antes, sem tanto apego emocional, como foi em Nekketsu-hen, mas foi interessante ver como exploraram essa questão dela “prender” o Araragi, com o número de mãos indo aumentando a medida em que ela ia falando, e criando aquela sensação de que estava segurando ele ali, junto dela.

Além disso, é nesse momento em que o Araragi toma coragem, e decidi assumir o seu erro e enfrentar a Kiss-Shot, o que por consequência, leva aquela luta incrível.

O final de uma lenda.

Aquele luta me fez ter certeza que não importava quantos cigarros o Oshino deixasse de acender, não tinha como receber um anime. Não que fosse impossível adaptar, mas eu não consigo ver aquele tipo de violência sendo feito em uma temporada de 12 episódio.

O mais estranho em tudo, é que não chega a ser um gore pesado, como algumas outras cenas que têm por aí, mas ainda consegue ser impactante (e bem violenta).

Por mais que tenham deixa sutil com alguns simbolismo, e até mesmo gerado um certo alívio cômico, a brutalidade da cena foi preservada. Foi um pouco estendida, e exagerada em alguns pontos por conta das adaptações para filme, porém, naquele instante em que a Hanekawa está agachada em pânico, passa o exato sentimento de tudo.

Não foi uma luta, foi um festival de desmembramentos e sangue. Aquele slowmotion é a luta perfeita, com os dois arrancando braços, se decapitando, a Kiss-Shot rindo de tudo.  E o único ponto que não torna esse final perfeito, é por uma questão de adaptação, que de certa forma, foi um erro “sério” por parte da Shaft.

Eu mesmo só me dei conta quando a cena surgiu.

A Hanekawa diz inúmeras vezes durante a série, que não sabe de tudo, só sabe do que sabe, mas parece que a Shaft se esqueceu desse detalhe.

Em algum momento de Nekketsu-hen, ela deveria ter conversando com o Araragi sobre as possíveis formas de trazer ele de volta ao normal. Ela faz uma pesquisa sobre, e explica algumas das teorias e lendas, onde tudo se resumia ao ponto de: “para recuperar sua humanidade, uma servo precisa romper os laços com seu mestre”.

No final das contas, a explicação não fica ruim, ou sem sentido, mas se pensar de maneira lógica, ela não tinha como deduzir aquilo apenas vendo os dois se matarem, afinal de contas, ela nunca conversou com a Kiss-Shot.

Meu fanatismo diz que tem mais, porém, esse foi único grave.

Por mais que tenha rolado um leve deslize ali, as explicações são feitas, e você entende a situação geral. Não tem como o Araragi voltar ao normal sem matar a Kiss-Shot, mas ela está disposta a fazer isso por conta de tudo o que ele fez por ela. Porém, é nesse ponto que meu paradoxo mental chega ao máximo.

Eu cheguei a comentar na review de Tekketsu-hen, como a cena do encontro entre os dois, por mais que mudada, ficou boa e teve o impacto necessário.

Para quem já tinha a informação de antemão, o chorou do bebê, a forma como ela se desesperou e implorou para continuar viva, são detalhes e sensações que são intensificadas porque você visualiza essa situação do final.

A Kiss-Shot não queria morrer, mas pelo Araragi ela faria isso. Foi nele que ela encontrou uma forma de “pagar” seus pecados. O problema é que parece um pouco errado. Ela não deveria morrer, mas também não pode continuar viva, porque assim, o Araragi não poderia voltar ao normal. A solução? Não é nem um pouco legal.

Particularmente, eu não consigo concordar… Por mais que também não posso discordar

Como o Oshino mesmo diz, não tem como deixar os dois feliz, o máximo que vai acontecer, e compartilharem juntos a mesma infelicidade. Ou o Araragi passa a viver como vampiro e tira a necessidade da Kiss-Shot morrer, ou ele volta a ser humano ao preço da  vida dela. As situações são tão contraditórias que eu não consigo encontrar uma solução.

Deixar ela morrer parece errado por conta de tudo o que acontece no resto da série, mas negar a existência de algo, ou alguém, é uma das coisas que não consigo aceitar como correto.

Por mais que a loli loira, que adora rosquinha, seja bonitinha e divertida, ela não é a Kiss-Shot, ela é só o resto de um vampira lendária, de uma orgulhosa vampira que foi pisada pelo egoísmo de um adolescente.

O modo como ela se desespera e se revolta quando o Araragi toma a decisão por si mesmo, negando o novo propósito que ela encontrou para os 500 anos de existência que carregou, deixa tudo complicado demais.

Ela viveu esses anos todos com o peso de ter falhado com o primeiro servo, e quando encontra uma maneira de se redimir, isso não acontece porque o ponto de vista exterior (Araragi) não concorda. No final, ao invés de ter um honrado fim para a sua vida, ela  ganha um novo recomeço como uma sombra. Uma vampira que não é mais uma vampira, uma esquisitice que não é mais uma esquisitice.

Apenas um ponto qualquer.

Sabendo disso, de toda essa história, e dos porquês daquela garotinha loira do Bakemonogatari ser tão apática, e do Araragi se sentir culpado por tudo, chegando ao ponto de dizer que aceitaria ser morto por ela, caso fosse da sua vontade.  E até mesmo usando do meu sofisma do início do texto.

Como protagonista, o Araragi é uma verdade fraca demais para se sustentar, ou uma mentira boa o bastante para não ser negada?

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E você, que nota daria ao filme?

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Extra

Um paralelo meio aleatório…

Na minha primeira review de Sakurada Reset, eu cheguei a comentar do duplo sentido que a palavra Gizen(hipocrisia) tem em japonês, criando a ideia de “falsa bondade”. Para quem gosta desse tipo de jogos de palavra, pode ser interessante. E para quem acompanha Sakurada, fica a dica de como se faz um bom personagem “gizen”

Sério, Shaft, isso não se faz T.T

 

Sutileza e elegância até mesmo para se empalar.

Nada a declarar.

Esqueceu do guarda-chuva vermelho, justo quando precisava.

Marcelo Almeida

Fascinado nessa coisa peculiar conhecida como cultura japonesa, o que por consequência acabou me fazendo criar um vicio em escrever. Adoro anime, mangás e ler/jogar quase tudo.